quinta-feira, setembro 30, 2010

Em fase de terra

Nada consegue conter e muito menos contar a solidão da gente. Procura-se no céu e no vão. Ledo engano vasculhá-la no infinito. Se lá estivesse, estaria em mil bocados. Fragmentos. O chão da greta e do broto é a melhor gramática. E de repente, a lagartixa doida e o quieto formigão fazem melhor república que isto aqui. Sem a maralha, o Rei vai nu e o pessoal está renitente. Às duras penas, o poema se refugiava aqui. Meio descrente da própria palavra. Com perdão pela má palavra, mas o grande erro é o acerto. Queria desacertar a vida toda. Gostar mais do vazio que do cheio. E me decompor na crosta que sou. Poeta, eu? Só porque às vezes – cada vez mais menos, diga-se – me afoito a rimas toantes com tomates e farinha de mandioca. O resto sendo assalto. Assonância ou ressonância? Ou tão simplesmente sobressalto…

terça-feira, setembro 28, 2010

K_ultura no Petit Pays

Do cosmos e do caos

A aeromoça da TACV anuncia a aproximação do Aeroporto Internacional da Praia. Os passageiros endireitam as costas das cadeiras e das mesas, apertando os cintos de segurança. Da escotilha do avião, descortina-se a Cidade da Praia: linda, rendilhada pelo mar e inconforme no seu afã de metrópole. O Farol Maria Pia, quase como obelisco na ponta do istmo. O Ilhéu de Santa Maria, divino e felizmente intocado. As achadas e os baixios, bem como as sinuosidades da orla. A ilha de Santiago, agora verde devido às chuvas, abraça a Capital que se implode no amparo da baia. Do alto parece um poema. Balbucia-se o lindo poema que lhe fizera Jorge Carlos Fonseca. O sonho da Praia cosmopolita, entregue ao cosmos. Já em terra, as coisas são outras. São o caos. Os detalhes das imperfeições e das insatisfações. O insano. A cidade a precisar de mais e melhores cuidados de todos – da edilidade, do Governo, da sociedade e do cidadão -, para exalar a áurea que se lhe descortina do ar.

Outubro pródigo e bonito

Este Outubro, que entra pródigo e bonito, de fartas águas e verde chão, é tempo em que o meu kodé faz oito anos e em que se aborda também a Cultura, como imperiosa necessidade para a identidade, para a diplomacia, para a economia e para a competitividade. Mês da Cultura, porque oficialmente efeméride de Eugénio Tavares, reconhecimento probo e em boa altura institucionalizada pelas autoridades cabo-verdianas. Mas as coisas precisam acontecer depois dos seus arquétipos. Aliás, elas já aconteciam antes de os aparatos serem montados e reclamam transcendê-los. Assim, faz sentido que cheguemos ao ponto de questionar e de gizar, com desdobramentos de reflexões e debates (em crítica, mas não em crise), sobre o papel da Cultura em seus vários cenários. É a Cultura que canta “Petit Pays, je t´aime beaucoup”, ampliando Cabo Verde, pela força do softpower, no mundo. É a Cultura o grande leitmotiv da Caboverdianidade.

Diplomacia cultural cabo-verdiana

Defendo, numa palestra sobre “A cultura como um dos pilares da diplomacia: mecanismos e eixos de promoção da cultura cabo-verdiana no exterior “, a ideia de se criar, como recurso coadjuvante à diplomacia clássica e complementar à diplomacia económica, o Instituto Eugénio Tavares. Este seria um organismo fomentador de uma agenda cultural no exterior, tanto junto à Diáspora Cabo-verdiana como junto aos países com os quais temos relações diplomáticas activas e dinâmicas. Assim como o Instituto Camões, de Portugal, e o Instituto Machado de Assis, do Brasil, o hipotético Instituto Eugénio Tavares, mutatis mutandis, deveria tutelar-se pelo Ministério do Ensino Superior, Ciência e Cultura, em articulação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros e o Ministério da Emigração. Isso, a par de uma maior capilaridade de diplomatas ou de personalidades da Cultura, a servirem como adidos culturais junto às nossas Embaixadas.

Diplomacia cultural tout court

Os países emergentes, ao não possuírem uma diplomacia cultural, complementar à actividade diplomática tradicional e à diplomacia económica já instaurada, insistem na prevalência das relações internacionais de estratégias inspiradas pelo hardpower e pela subvalorização do softpower. É preciso que os mesmos compreendam que, com o avanço dos processos de globalização económica e tecnológica, as relações internacionais passaram a depender, cada vez mais intensamente, da cultura e do softpower, não se confinando ao poder económico ou à barganha política. Diferentemente do que ocorre em países como a França, a Itália e a Espanha, bem como na lusofonia em países como Portugal e o Brasil, que desenvolvem projectos para divulgar a sua ampla gama de expressões culturais, por meio de uma política exterior integral e integradora, em países como Cabo Verde a Cultura não ainda é considerada um factor coadjuvante da política externa.

terça-feira, setembro 21, 2010

Orvalho, névoa, cerração e neblina no alvorecer

Ao meu amigo Omar Camillo


 
Estarei aqui para rezar,
agradecer a Deus este conforto gigante.

Adélia Prado


Dia lindo

Não repares, amigo, nascerem certos dias ao contrário. Mas ora descortino orvalho, névoa, cerração e neblina, numa linda sinfonia. Alvorece, amiúde, um dia lindo. Será que também raiou um dia de rara beleza sobre a Pátria, aquela do canta, irmão, do canta, meu irmão, enquanto me desnudo para um banho de pétalas? Não que eu descortine a República como um mural de sombras ou em clarões bem mais difusos. Mas carrego as minhas legítimas dúvidas sobre o Banho Pátrio, se não estaremos confundindo nós sempre nuvem com Juno, a mandar para o ralo o bebé banhado. Já a mesma preocupação tivera Eugénio Tavares, em tempo menos probo, e fora o Poeta perseguido e executado pelas feras de serviço. Dúvidas existenciais, diria, posto que já na soleira da senectude, saber para onde se vai mandatário se torna. Será que sobre a Pátria, outrora terra dos nossos avôs, ora de o homem a certeza, recaiam as seleccionadas estrelas do zodíaco e nos emprestem alguma luz estelar de outros caminhos?

Maçónica disfraçada

Se do Velhote irmanasse a Pátria, se dele também emanasse, para além da espuma que lhe cristaliza a fronte e lhe doura o corno da República, a luminosa fonte da Verdade, fosse ainda ele, para o gáudio dos Melhores Filhos, o dono da res publica, eu me queria tão longe quão eremita, em busca do Nirvana. Numa recuada montanha e um condor viria ao fim da tarde dialogar comigo e a neblina. Ou quem sabe valesse a pena baralhar e jogar de novo, estando, como estão, as quinas viciadas. Restaria o consolo (e a grata esperança) de as verdades se tornarem todas biodegradáveis e mal-cheirosas. O haver dinâmico desafio da vida a estes acerbos dias. E a Pátria, ao invés de assaz maçónica disfarçada, se tornasse, cada vez mais, casa, abrigo e porto seguro de todos nós...

Nu na janela

Tão nu como nasci, vejo Belo Horizonte pela vidraça. Sem as afoitas vestes da certeza, nem os sapatos da esperteza, esta cidade me encanta. A minha consentida solidão sabe ao abraço de uma deusa tântrica e mais cósmica diante da real nudez. Homem peladão, como em lascivos momentos a divina faria jus ao “um ano embarquei nos seus olhos e, desde então, não navego mais sozinha”. E é cómico como me soa a poema o amanho desse pássaro! Carece e merece o Albatroz de bons momentos. Como todo o mundo, aliás...

Godot, crónica & etc

Fiquemos, amigo, aqui por ora. Enquanto isso (ou, antes que mais tarde anoiteça), penhoradamente agradeço aos leitores pela paciência com que passeiam por estas croniquetas amenas. Uns há que esperam Godot (é a grande maioria). Outros hão de aguardar pelo K Magazine, a cada quinta-feira. Nesse meio tempo, amigo, orvalho, névoa, cerração e neblina no alvorecer de dia bem mais lindo...

terça-feira, setembro 14, 2010

Do cisne

A Rute Pires, amiga, a cumprir os anos

(De repente, o cisne: branco, branco, branco. Trocava-o pelos jacarezinhos de Tocantins. De repente, os alpinos montes. Deixava-me emocionar pelas águas que vazam do além. Amazónia, diria você)


Não tanto se via quanto desliza,
Todavia, fio que se alisa no lago,
Em ser, rastro de cisne, mastro
O que vira, de seu lastro, eu…

Quedo e quieto, sem este grito
Nem aquele atrito, algo restrito
Que se alteasse, ateu que sou,
Sussurro de Deus em seu olhar…

(Branco, branco, branco, o cisne. Mas do pássaro que se escuta. Afoito pássaro do nada. Em suas cores do ocaso. Você também é poema…)

Filinto Elísio

Dez equilíbrios de Deus


Sublime dinâmico

Chove, troveja e relampeja. Há aqui uma tempestade. Helás! Termino mais um livro de poemas: intitulo-o “Dez Equilíbrios de Deus”. Havendo excessos da Realidade, estes a absolutizarem-se sobre as demais realidades, importaria, como contraponto existencial, não abrir mão da poesia. Naturalmente que, enquanto poeta, quero estar à margem das coisas para pressentir (cá dentro) a pequenez dos semi-deuses e dos deuses locais, e para inalar o halo sublime de Deus (também cá dentro e não no Sinai) em seus “Dez Equilíbrios” e jamais em seus Mandamentos. Quiçá, para o leitor mais atento, faça tudo isso algum sentido, mas para o mais distraído olhar de Sancho Pança, nas antípodas de Alonjo Quijano, mormente seu complemento, os moinhos só serão moinhos. É preciso ver em tudo, a sua tempestade. Umberto Eco diria: “Exemplo típico do sublime dinâmico é a visão de uma tempestade”…

Montanha parindo rato

Vem, irmão, a urbe, a natura e o cosmos me interessam. E o amor, que é a verdadeira energia renovável. O resto pode esperar para depois da tempestade. Vem, irmão, olha-me para esta lixeira a céu aberto e o halo das queimadas incensa o mote dessa Grande Circular. Vejo o Mote Vermelho, esburacado como um queijo suíço. Extirpado dir-se-ia por um assassino serial. Anaxímenes defendia que o universo resultava das mutações do pneuma áiperon (ar infinito), como nossa alma que é ar, soberanamente nos mantém unidos, assim, também todo o cosmos sopro e ar o mantém. Vejo o Monte Vermelho e se não há crime ecológico (o ar infinito afinal), como o há na Praia Negra e haveria na Murdeira, vamos mudar de bandeira, hino, fé e crença. Vejo o Monte Vermelho, em cuja cercania se estende a não menos polémica Cidadela à espera do seu Cavalo de Tróia e peço licença ao leitor para vomitar. E, com perdão pelo demo de comparação da fala, se o Monte entrasse em serviço de parto e nos parisse ali um rato vermelho? Quem sabe não ressurgisse daí o sopro e ar dos próximos caminhos…

Haver cidades

Saúdo, efusivamente, a iniciativa de decretar cidades às sedes concelhias, algo que se estriba no nexo de respostas à dinâmica de urbanização do País. É um acto mais que constitutivo, mas prospectivo, em prol das cidades que, doravante, terão os apoios institucionais e administrativos, bem como as políticas públicas mais dirigidas, para uma urbanização qualificada. E o que seriam, ao meu modesto ver, essas políticas públicas mais dirigidas? Antes de mais, o urbanismo submetido ao plano director municipal e ao plano de saneamento ambiental, ao projecto das centralidades económicas, sociais, culturais e outras, bem como à gestão moderna e sustentável do espaço-cidade, que é, acima de tudo, uma polarizada geografia humana. Antevejo o próximo cenário governativo com muitas inovações, dentre elas o Ministério das Cidades. Mas é algo que transcende o planeamento dos gabinetes. Acrescentam-se-lhes elementos de força para uma melhor gestão das cidades, nomeadamente a mobilidade, sustentabilidade, multiculturalidade e sociodiversidade Em verdade, a urbanização, não só do ponto de vista sociológico, mas da perspectiva política, se tornou numa grande realidade nacional. E não se deve fugir às realidades…

Trivium

Volto, como quem já tarda, na próxima semana…

sábado, setembro 11, 2010

Solilóquio de tartaruga ou baleia & poeta em sua janela

Baixinho, quase em segredo

Baixinho, quase em segredo, não vá a cidade malfadar esta mania, mas gosto de falar sozinho. Quando estou só chego a declamar odes e epopeias. Se não aparecer vivalma até faço discurso sobre o estado da Nação. Sei que o pessoal toma tal excentricidade como coisa de maluco e, algum mais generoso (porque, vasculhado, se encontra) como coisa de poeta. Ultimamente, dizem que é do aproximar das eleições, certos vigilantes espalham-se pelos bares, esplanadas, restaurantes, locais de trabalho e prédios de moradia, a tentar identificar os que falam sozinho. Os que falam só, contrariamente aos que só falam, são um perigo para a nossa jovem democracia, dizem. Tais vigilantes não se deixam emocionar pelas prerrogativas da loucura ou da poesia. Vou ter de tomar uma providência…

Sem algum porém

Ele parece mesmo uma tartaruga ou uma baleia: animais em vias de extinção. Quem souber das suas coordenadas, corra logo a notificar a imprensa. O denunciante terá direito a ser entrevistado no telejornal e outras mordomias da classe dirigente. Vejo-o, mas fico calado. Proteger as espécies é jogar limpo com a existência. E o garção pergunta quer mais do mais ou mais do menos e eu, um tanto deliciado, cá para mim que ele me sugestionava os versos de Arnaldo Antunes, respondo queria mais desse menos e, no dizendo, fazendo, me foi servido mais uma taça de vinho tinto.

No que acontece lá fora

Lá fora, a noite se esboçando. Cá dentro (em como me lamento), o fado de uma saudade. Os versos que balbucio: Cupido não divulga quando vem. Nem quando não vem, penso, logo existo. O poema, entretanto, está parado. Estagnado da silva. Como a rua, de repente, parada diante do semáforo vermelho. Ou, então, à hora cambaleante. Um engarrafamento não chega a ser romântico. Mas tu acharias que sim? Temos cidade! Olho pela janela: a rua. Lá fora, mais ao alto, a lua. Cá dentro (no quarto do meu pensamento), mulher nua que me arrebata…

terça-feira, setembro 07, 2010

Terçar armas

Chove

Gosto de sentir a chuva, quando vagarosa como agora e deixa uma batida de saudade cá dentro. Em verdade, gosto mais do céu com cara de chuva. Não que eu esteja romântico, realista, hiper-realista, surrealista, blá-blá-blá. Apenas ando nostálgico por estes dias. E um cristão (quanto mais um ateu) terá direito de acordar encharcado, como amanhã, por triz do acaso, possa ele se raiar solar para caramba. Chuva suave, parecendo brisa. E eu vou escrevendo como um navio à vela que, indo longe no mar, se esbate na neblina. Chove e a chuva para mim é aquela canção de Jorge Benjor "Chove, chuva": simplista, quase cristalina, com a verdade da água de uma lagoinha. Vezeiro, costumaz e renitente da minha varanda, vejo o mundo acinzentado. Terçar armas contra a solidão? Deixai-me em busca dos meus silêncios desavindos. Uns estarão pela chuva vagarosa e mansa, outros andarão em tal navio pela névoa plúmbea. Desconfio, vasculhando-os de fio a pavio, que é tudo vazio. Senão tão venal quão será o pensamento,  existirei de haver cá dentro batida de saudade...

Água rósea dos cântaros

Conta-me o amigo João Branco da perfídia dos seus detractores anónimos. Mas o que queria ele que houvesse? Gente reconhecida, grata e alegre por já haver movida teatral em Cabo Verde? Gente saudável e sem peçonha, de bater palmas quando se iluminam as luzes da ribalta? Gente que não mata, nem esfola, quando se lhe aparece outrem com a graça de uma borboleta e o viço de uma rosa em seu lado de cá? Não, meu caro. O meio não é pequeno, mas tacanho. Os tempos não são novos, mas minguados. É tudo neófito, do piorio e bafiento: a xenofobia à moda, o racismo emprestado e a contradança da malidecência. Eugénio Tavares, ora patrono da Cultura, passou pior com a miudeza administrativa. Mesmo Baltasar Lopes, ora adulado em morte, era apupado pelos mediocres da parvónia. E Amilcar Cabral, que a veneranda ora cita, fora ceifado pelos seus. A perfídia verde ou amarela - a peçonha seja ela em arco-íris -, tal como as chagas no dorso de Cristo, os detractores anónimos são o ínfimo sinal de sermos água rósea dos cântaros...

segunda-feira, setembro 06, 2010

Beirada da quietude

Às escuras

Estou na beirada da quietude e sou um crente na mudança das coisas. Se a água é o precioso líquido, a energia tornou-se também produto de primeira necessidade. Como passar dias a fio sem música, nem Internet? Como jogar ao lixo, sem praguejar, o que estaria no frigorífico: o leite e o iogurte do Pablo, o queijo de Rui Vaz e as sobras da mousse de abacate? E como ser feliz sem o ventilador chinês que, nestes dias de calor do cão, tem sido o meu bálsamo? Logo eu que detesto a luz bafienta das velas. Que abomino as luzes de presença. E os luares que entram pela janela (e tu assim longe daqui), não me conferem romantismo algum aos momentos. Já disse que sou um crente na mudança das coisas e longe de mim pressionar alguém por causa desta afronta colectiva da falta de energia. Afinal todos somos pecadores e impõe-se-nos o dever dos mansos de espírito. O dever da ironia e chamarmos à quietude “Amor em tempos da escuridão”. Sermos capazes de esperar pela energia alternativa. Entrementes, apetece-me voar. No pensamento, naturalmente. Abstrair-me disto que a felicidade, em existindo, terá qualquer coisa de voo ou de pelo menos esvoaçante. Voar sem alarde, nem alvoroço. Sem estratégia, nem plano. Planar apenas e tão-só. Como se sobrevoasse em asa delta uma beirada da quietude. Sem nada. Zen apenas…

Bem-aventurança do medo

Um dia, assistindo pela televisão, a uma entrevista de Frederico Fellini, retive isto: o medo é um elemento vital para o ser humano. Bravíssimo, Frederico. Todos, por sermos humanos, temos medo. E os que se arvoram sem medo têm atitudes desumanas. Os que atiram à população revoltada e manifestante em Moçambique não têm medo. Os que pretendem condenar à morte por pedrada uma mulher no Irão também não têm medo. E os que mandam executar adversários políticos na Guiné Equatorial recusam para si a humanidade do medo. Eu tenho medo que a flor não desabroche e a abelha desapareça. Tenho medo que o Pólo Norte se desfaça e as ilhas rasas se tornem submersas. Medo que um furacão se desvie para o Norte e o meu filho Denzel a estudar em Lowell. Medo que, no meio da avenida, te dê um branco e esqueças de me amar, enquanto o semáforo não muda. Medo de magoar alguém e ir para a cama com o remorso da insónia. Medo, muito medo, de dormir vivo e acordar morto. Medo, muito medo, de não dar todos os abraços que o meu velho merece. Sem nenhuma gana de escrever poesia. Ou de não poder voar pela beirada da quietude…