tag:blogger.com,1999:blog-50694936416125373642024-02-20T21:32:39.328-08:00Beira-mar desmedidoFilinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comBlogger144125tag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-36642461071706368082011-03-21T07:19:00.000-07:002011-03-21T07:19:34.049-07:00De estarmos em Março<strong>Japão </strong><br />
<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Há que vocalizar, em tempo mais que preciso, o nosso sentir da catástrofe. Sublinhando, naturalmente, o lento regresso à normalidade, já que o infortúnio não é eterno a pairar sobre o Mundo. Primeiro, o terramoto. Depois, o maremoto (virou moda chamar-se-lhe tsunami). E, puro coice na queda, o risco de contaminação nuclear. Perante tudo isso, tão grande a nossa admiração quão total a nossa solidariedade pelo povo japonês. O estoicismo, a disciplina e a ética colectiva. A religiosidade aprumada do fazer coisas com esmero. Essa outra coisa, diferente e apartada, dir-se-ia ideograma de um mundo complexo, mas que se estampa em frágil seda e se rendilha com aparada linha. Qualquer som de gongo que, do seu vibrar longínquo, faz voar a mais ágil borboleta à porta do templo. Por um instante, não se pense o Japão industrial, portentoso e trepidante. O Japão competitivo e imperial. O Japão omnipotente é outro e tem cara pesada. Biombo de bambu, fresca brisa sobre as flores de tangerina. Sente-se o Japão da ágil, mas também frágil, borboleta.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Dia Mundial da Poesia</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">A Poesia não deveria ter ‘dia mundial’, essas coisas que, tornadas efemérides, geram obrigações, compromissos, politiquices, o que se sabe. A Poesia deveria ser solta, desabrida, vadia, puro tesão, mesmo que ruborize faces encalhadas dos dias estabelecidos. Que subverta os valores, troque os dias pelas noites e os Vês pelos Bês. Que pule a cerca e se evada destes campos fechados e que concentram a mediocridade dos poderes. Qual ‘dia mundial’! Todos os dias são dia mundial da poesia, ora. Continuem os poetas a carpir o sal dos dias que lhes carcome a pele e lhes cinzela o coração de quase nada. Continuem eles, tal como o albatroz descrito por Charles de Baudelaire, a serem, à vista longínqua, príncipes das nuvens e, à proximidade rasca da canalha, feios e trôpegos seres. Continuem eles ‘altos atletas da mágoa’, assim benquistos pelo nosso José Luís Tavares, esses livres, libertinos e o que mais queiram vocês que aturam seus dislates.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Mário Lúcio Sousa </strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Saúdo, com amizade e confiança, Mário Lúcio Sousa, poeta, dramaturgo, músico, artista plástico e activista cultural, ora tornado Ministro da Cultura. Antes de mais, o meu regozijo pelo retorno à autonomização da Cultura na orgânica governativa, porque, tal como o vaticínio de Pêro Vaz de Caminha a reportar ao Rei de Portugal a ‘descoberta’ do Brasil, a Cultura Cabo-verdiana se plantada, dá. Depois, o meu regozijo puro e duro pela escolha de um intelectual arguto, sereno e bem relacionado com Cabo Verde e o Mundo para assumir o cargo numa hora em que se nos impedem desafios da integração global e da afinação pelos nunca dantes navegados mares do Desenvolvimento. Um país não se mede apenas pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), mas tambem pelo produto não bruto (e quase sempre imaterial), que amiude vamos produzindo com as nossas almas. Haja sementeira!</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Nota:</strong> Por razões ponderosas, a ver com encargos outros, nem sempre compatíveis com o estarmos ‘em crónica’, são estas as últimas notas do K Magazine. Devo, neste momento, agradecer a todos quantos de alguma forma deram atenção a estes escritos. Foram centenas de crónicas, tantas que, em cuidada selecção e revisão, poderão tornar-se em livro. Ficarei com saudades do meu ‘vizinho’ Daniel Medina, confrade com o qual venho dividindo a página do jornal A Nação. Vou ler os seus textos sempre com agrado e balbuciar que o modo vale mais que a moda. Igualmente, agradeço de coração os que labutam neste semanário e, na pessoa de Alexandre Semedo, dou um abraço a cada um. Finda o primeiro acto. Não tarda o abrir do pano para o segundo acto. Ou não estaríamos em Março, mês do Teatro…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-16084105863739405832011-03-14T08:36:00.000-07:002011-03-14T08:36:59.602-07:00No ovo desta manhã, companheiros<div style="text-align: justify;"><strong>Das tais sintaxes (para o amigo Fausto do Rosário)</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Dedica-me (a mim e ao amigo Brito Semedo) uma meia crónica o (também amigo) Fausto do Rosário. Delicia-me a pena solta deste confrade que ora, pelo <em>Facebook</em>, louvando o Carnaval de São Filipe, vez por outra, dá sinais de cidadão atento de a República ter seus erros e desvios. Corre-lhe quiçá nas veias um pingo de sangue do sempre necessário Pedro Monteiro Cardoso. Latejam-lhe nas têmporas a irreverência e o aguçado sentido de busca de António Carreira. E cinzela-lhe a mão quem sabe se do âmago pressentido de Henrique Teixeira de Sousa. Tem-nos bem presentes outros nomes que não só os da portentosa ilha do Fogo, mas de cantos outros das afortunadas, tais lhe douram o espírito aqueles de Eugénio Tavares, Baltazar Lopes da Silva e Amílcar Cabral, homens maiúsculos no dizer de Mário Fonseca, saudoso amigo comum. Fonseca, se me permitem, o mais ‘turbulent oiseau’ da moderna intelectualidade cabo-verdiana. Entrementes, falava-nos Fausto do Rosário do Cinema, dos filmes que fizeram a nossa infância e a nossa adolescência. Pois ali, em tempo ulterior (ontológico mais que algum outro), a assistir o <em>Cidadão Kane</em> (oh, quase eterno Orson Wells) à sua hora derradeira sem a magnitude que a narrativa, em retrospecto, nos balbucia: ‘Rosebud’. Apenas isso…a sua última palavra! </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Tragédia no Japão</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">O que acontece agora no Japão – pura natureza que, ciclicamente, se impõe aos homens – é dantesco e triste. Fatalidade ou tragédia? Fazem relativizar a vida e a morte. Faz pensar naquela canção de Caetano Veloso em que ‘a vida não é mais do que um acto de ficar no ar/ antes de mergulhar’. Faz pensar que não devíamos brigar uns com os outros, nem devíamos deixar de nos abraçarmos. Quando uma onda gigante, quase do tamanho do fim do mundo, invade a praia…o que somos afinal? Quando a terra treme e as torres brutamontes do império são apenas a concupiscência do poder e do dinheiro…não seremos também a ruína em nós próprios? O mesmo drama que percorreu o Haiti no ano passado. A tragédia em geografia, nas suas coordenadas de latitude e de longitude, e, sobretudo, no seu pulsar dentro de cada um de nós. De que vale criminalizarmos os sapientes que, por sua fala e veredicto, é inútil e onerosa a classe dirigente? De que vale fazermos revoluções, contra-revoluções, anarquias e outras tropelias dignas dos visigodos se, de repente, um tsunami reduz tudo à morte de um ápice? De que vale sermos reis no carnaval de passagem, sendo a vida dois dias e, mesmo isso, contingente como se vê por aí? Dantesco e triste, tanto sofrimento. Brutal e orgíaca, não deixando de ser perversamente irónica, uma eventual fuga radioactiva no Japão. Radioactividade sobre o país do sol nascente? Em Agosto de 1945, o mundo estremecera com uma espécie de sol perverso e desumano, incinerando e pulverizando tudo – a bomba atómica sobre Hiroshima. Contrariamente à fatalidade destes dias, que a todos faz repensar a vida, aquilo fora a maior tragédia da humanidade. Da desumanidade, queria eu enfatizar.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Da Esperança</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Olhemo-nos ao espelho, companheiros. Olhemo-nos demorada e silenciosamente ao espelho, companheiros. Olhemo-nos introspectivamente ao espelho. Perscrutemos, nas nossas rugas, os sulcos daninhos com que os outros se entregaram aos dias. Vejamos que afinal temos a sensação rasca dos comuns e que, lá por estarmos no altar, nada portamos de santo. Sintamos cá dentro as nossas misérias, colhamos, <em>de profundis</em>, a nossa estação do inferno. Mil vezes saibamos a grandeza de esconjurar a ganância, o desmedido poder de dispor e de indispor, e a real solidão que é do mais alto andor. Saibamos vomitar, mercê da náusea que se nos afronta. Saibamos recusar o prato feito, o ‘doce que só a mim me dais’, saibamos sentir o pão que o diabo amassou. Olhemo-nos ao espelho, companheiros. Já Einstein dizia que mais fácil destruir o átomo que o preconceito. O primeiro, é uma questão de ciência e, o segundo, uma questão de consciência. Olhemo-nos demorada e silenciosamente ao espelho, companheiros. Para a ciência do átomo e a consciência de derrubar o preconceito. Para a relativização de tudo, tudo, tudíssimo. Olhemo-nos introspectivamente ao espelho. Para a desintegração da barbárie nossa. Para a inversão do ímpeto de matarmos, no ovo desta manhã, a Esperança…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-5883796492021770502011-02-22T05:53:00.000-08:002011-02-22T05:54:46.526-08:00Hominem te memento<strong>Crónica</strong><br />
<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Não sei, em nome de que santo ou por que penitência devo escrever estas mais que previsíveis crónicas semanalmente. Quase sempre estou cansado de inventar histórias e de me armar em coisa alguma, quando o sol se põe no mesmo lugar e a mulher que passa é encantadora seja na estação das mangas ou na das goiabas. Exausto de ouvir senhores doutores a falarem das vantagens competitivas e das vantagens comparativas e depois se fazerem de deuses, ainda que tristes deuses destas pobres esquinas. Estou hoje com uma nóia daquelas. Com a porra louca, como diria o Pranchinha. Acordo filosófico e estranho, com vontade de comer arroz de atum e ler uma história de crianças, mas, por razões que o diabo explicará, terei de terminar a crónica e entregá-la a tempo, eu que, na encarnação anterior, joguei no Benfica ou algo do tipo. Desesperado com a hipocrisia que cerca tudo, inclusive o santo no altar, penso num verso de Sá Carneiro que, se entrevia na morte ajaezada e à andaluza, por força indo de burro. Agora penso, logo existo, que merda. Todo o homem, mesmo o mais esquecido e marginal, ao morrer tem direito à lapidar frase: saio de cena para entrar na história! O viajar desta para melhor é nunca mais ver a Mayra Andrade a cantar «Tunuca», de Orlando Pantera? Havendo vida doutro lado pode-se beber um tinto com Franz Kafka ou degustar uma rabanada com Charles de Baudelaire? Tomarei absinto com Jorge Luís Borges? Poderei novamente dormitar no colo da minha mãe? Ou não havendo nada disso se desfaz em pó, em alquimia igual à que se impõe aos mauzões da vida? </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Em degradante…hominem</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Leio, com indignação, a forma desumana, fascista e facínora com que as autoridades reprimem uma manifestação em Tripoli. Por mim, viria a casa abaixo e instaurava-se o regime dos direitos, das liberdades e das garantias. Cada Povo tem o seu tempo histórico e faz cair, ao seu momento, muros e torres. Novas Trombetas de Jericó fazem ruir compactas ditaduras, quer no faraónico Egipto, quer na Líbia ardente. E um pouco por toda a parte, dir-se-ia em revivalismo do fim da guerra fria, os poderes degradam-se e tornam-se mais frágeis. Ainda bem que assim seja…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Crónica ainda</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Mais do que para quê escrever, a questão palpitante vasculha-se no porquê de o fazer. Não pretendam simplificar as coisas que isto se recusa á sintaxe de puro desejo e, mesmo à elástica semântica da palavra, ele se lhe rebela ficar pela rama. Escrever? Fosse eu, bem mais jovem, belo Apolo ou algo afim, macho em mais intenso cio, voraz em jet sky ou macio em asa delta, em que viés ou porque cargas de água escrever crónicas? Fosse este que vos anda a maçar semanalmente com citações de Cícero e do vagabundo de esquina um príncipe, um pequeno príncipe, mesmo não sendo de Saint Exuspéry, não se exasperaria perante o verbo, estranha vindima pela estação das uvas soltas? Mil vezes, ficar parado e contemplativo (afinal é o vulcão esse portentoso), totalmente esquecido no silêncio da Chã das Caldeiras. Tertuliano preparava-se para falar á imprensa; de repente, o meu amigo estava na televisão, cercado por uma floresta de repórteres, microfones, câmaras, as luzes dos flashes brilhando no momento único. Feliz de cansaço merecido e compensado. Ciente de ser a vida breve e a glória leve. Jorge, meu amigo, gosto da frase latina: <em>réspice post te! Hominem te memento!</em></div><em><br />
</em><br />
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</em>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-36879154055829712522011-02-15T01:19:00.000-08:002011-02-15T01:19:23.873-08:00Trancosos<div style="text-align: justify;"><strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Uma questão de método</span></strong></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Nada tenho contra o método de Hondt, que sempre ajusta a minoria contra a tentação «tsunâmica» de quem ganha. Mas devo dizer que o método provou falho e alienador da cidadania nestas últimas eleições legislativas. Em verdade, o erro nem está no método. Está na sua aplicação tout court em cima da reforma eleitoral, em que os círculos eleitorais decalcados em concelhos/municípios passaram a ser círculos de ilhas, à excepção de Santiago, rachado ao meio – norte e sul. O caso do Fogo, a melhor vitória eleitoral absoluta do PAICV, acabou por ser relativizado pelos mandatos que fixou (3 a 2) sobre o MpD. Contas feitas, bem feitinhas, revelam que os tambarinas conseguiram mais 4.306 votos que os ventoinhas na ilha do vulcão, destes 1.902 não contaram na determinação de mandatos. Neste mesmo arquipélago e no quadro das mesmas eleições, o partido de Carlos Veiga consegui (2 a 1) sobre o partido de José Maria Neves, na ilha do Sal, com um diferencial de escassos 78 votos. Se a base da democracia reside no voto expresso de cada um, os dois exemplos provam que algo não vai bem e que precisamos mudar de método. Sejamos claros e corajosos; sejamos conscientes em relação à cidadania: este método Hondt em cima da dita reforma, por sinal constitucionalizada, provou-se empobrecedor do processo eleitoral. Quelle honte!</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Método_logia</span></strong></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Lá por isso, não defenderia o sistema absoluto. O ganhador toma tudo e seus afluentes, assim não dá. Ficava-se sob o risco da tirania da maioria, aliás contraproducente como diria Lani Guinier. Um amigo, despeitado por ter perdido as eleições, disse há dias que o nosso sistema está falido e que era momento de olhar para o sistema eleitoral americano. Fiz-lhe saber que a nossa constitucionalidade era outra. Diferente. Com méritos apartados daquele, com devido respeito. Qualquer dia traremos Rebelo de Sousa para dar «doutas lições» sobre este particular, já que a parvónia o aplaude de pé, para a náusea geral. Fosse, entretanto, em método absoluto, haveria nestas eleições um partido reduzido a 7 deputados (3 no Sal, 2 em São Nicolau e 2 no Maio)…aí era de facto um Deus nos acuda! </span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Outra história do Trancoso</span></strong></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Não é porque a parvónia já parece a história do Trancoso, mas porque nascer aqui e viver por cá, entre discursos caudalosos e histerias intelectuais das gabrielas, dispensa qualquer imitação ou pastiche de filme de Frederico Fellini. O nosso pátrio eleitorado acabou por dizer da sua justiça e, em passe de mágica, metade dos outdoors desapareceu das ruas. Não foi abacadabra para qualquer, mas algo digno da mui irreverente personagem que, em tempos mais recuados, deu de entrar nos meus pobres textos. Adivinhem que dou um doce. Caracterizando os sujeitos, com os seus predicados todos, eis que vos faço o «respectivo enquadramento». O Pranchina (de baptismo se apelidava Nené Prancha), era daqueles que só aparece de raro em raro, no caso um em dois milhões, significando, pela probabilidade, não haver mais desses em Cabo Verde. Profeta de papel passado e cidadão mal destinado. Mau das oiças, teimoso que nem uma porta, o seu desporto radical era se meter com gente grande e poderosa. Fazendo crónicas, ora furtivas, ora burlescas, entrepondo-se quase sempre no meio de crise política, de briga por mulherio ou de decisão de penalty, o Pranchina (artigo definido, devido à nossa intimidade) não tinha hora para aparecer, nem hora para dar a milha. A última do infeliz é insistir que a Escola do Turismo e Hoteleira está bem-posta e, já agora, composta e de que maneira na Menina do Mar. Ademais, acha que a iluminação da pedonal faz a capital parecer Londres, intensa e a nevoenta é a luz dos ditos painéis solares. Só lhe falta Jack, o Estripador, para isto ficar chispe, chique e foggy. Tanto esforço para o fiasco eleitoral. E as aves de rapina arribadas do reino que tantos comensais arrasaram nos melhores restaurantes da cidade que nos une? E esta? Aqui del rei, acadiré, cruz com a cadeira, etc e tal. Resignando à vontade divina, mas rebelando sempre à desfaçatez humana, a personagem continua de pouco pé no chão e de muito planar na lua. Entre o chão de massapé e assaz esvoaçar lunante, o cronista escolheria este a aquele. Já não se fazem mais desses na parvónia! Fui…</span></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-35327422251785372662011-02-08T01:42:00.000-08:002011-02-08T01:42:47.834-08:00Rio em seu rito<div style="text-align: justify;"><strong>Do rio e do seu rito</strong></div><div style="text-align: justify;"></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Percorre-nos uma espécie de rio, que não será linear, nem em toda a pressa, de margens ora estreitadas, ora alargadas, mas sempre em seu rito, em que dirás ser História (e nós dentro dela) pelo vector dito por Marx e eu ousaria ser dialéctica mais maluca do que a pensada; percorre-nos, não apenas o sangue que se desagua no estuário da morte, mas a vida que, sendo tal desvario, nos torna navegadores até do nada, cientes de sermos uma simples gota de água. Frágil borbulha nessa enxurrada. Pequena borbulha, aluvião de passagem. Uma coisa estranha, pequena de tão tamanha e grande pelo modo que entranha. Rio em seu rito…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Indícios do tempo</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Eleições feitas, crispações desfeitas. Amizades repostas. Mãos à obra, pessoal. Escolheu-se uma nova composição parlamentar e, em consequência desta nova legislatura, um novo Governo. Agora é hora de trabalhar, trabalhar, trabalhar. Cabo Verde precisa de bom governo e de boa oposição. Para ambos, é tempo de muda. José Maria Neves, político visionário e arguto, saberá que, para umas coisas, «mesti manti» e que, para outras, «mesti muda», sendo a democracia um espaço de intervenção de todos e para todos. Mais do que governar para as pessoas, Neves terá de governar com as pessoas, introduzindo inovações sociais, económicas e políticas. Não podem os partidos políticos açambarcar (e muito menos, monopolizar) a política, nem devem sonegar à sociedade civil o debate sobre o futuro. Mais Cabo Verde, que é o caminho a seguir, terá de ser gizado em debate alargado. Estamos prontos…</div><div style="text-align: justify;"><br />
<strong>Do assentar da poeira</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Depois da poeira assente, o que se deseja afinal senão a democracia, a equidade e a justiça social, a paz e a harmonia com o nosso meio ambiente natural – as tais palavras-chaves sendo, por isso, a qualidade de vida para todos? Deseja-se também introduzir um algoritmo nessa coisa colectiva e febril para a optimização individual, sendo esta a parcela que faria o somatório (e a lógica natural) daquela. Deseja-se, amiúde, que cada pessoa veja no processo histórico o seu processo pessoal, sem que tal seja entendido pelos «colectivistas de serviço» como egoísmo ou ilegitimidade. Deseja-se, como diria Edgar Morin, uma clara ecologia da acção. Haja ousadia e ambição…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Crónica mutante </strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Qual a crónica certeira para os tempos que são novos? Quais as novas respostas para quem, pela vida, só soube navegar na escrita? Continuar a reportar o ramerrame e repetir semanalmente aos leitores assaz sentimento? Ou derramar palavras como quem joga pedra às ondas e delas esperar a vaga mais furibunda e avassaladora? Serão verbos metaforizados esta busca de um discurso coerente e louco? Os mesmos ficarão condicionados pelo recente furor eleitoral? O cronista prepara-se, com armas e bagagens para sair da cena e, em assaz contagem decrescente, quer ele partir para novas aventuras estéticas. Pode? Pode sim e tão livre quão bíblico lhe continua o arbítrio…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-87715833188623690602011-02-04T04:55:00.001-08:002011-02-04T04:55:57.176-08:00Mais Cabo Verde<div style="text-align: justify;">Creiam, meus amigos, que o meu voto é pensado, ponderado e gizado. Com alguma parcimónia. Não será jamais um voto derramado no calor da emoção, nem aquele embriagado pelo carnaval da política. Fosse isto apenas para «animar a malta», acreditem que não faria este post. Procuro, no meu profundo dilema de Poeta, eleger um projecto que mais se aproxima ao Cabo Verde dos meus sonhos. Não me permitiria ao Cabo Verde dos meus pesadelos. Como diria Caetano Veloso: «Respeito muito minhas lágrimas». Um caso apenas: há dias, assisti, com profunda indignação, a grosseira ingerência do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa em tempo de antena de responsabilidade partidária a dizer aos Cabo-verdianos em quem votar. Fiquei chocado e enojado. Um festival de desamor à soberania de Cabo Verde e de falta de decoro para com os Cabo-verdianos. Por conseguinte, o meu voto é coerente e consequente. Quero mais Cultura, mais Desenvolvimento Sustentável, mais Estado Social e Mais Nação Global Cabo-verdiana. Mais SOBERANIA. Mais Cabo Verde. Votarei em José Maria Neves, no dia 6 de Fevereiro!</div><br />
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.Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-70431917730521926722011-02-01T09:00:00.000-08:002011-02-01T09:00:19.459-08:00A gostar do pôr-do-sol<strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">De uma não garantia</span></strong><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Não garanto poder escrever estas crónicas por muito tempo. Primo, elas já cansam a mim e aos leitores. Ser um gajo chato é o que detestava, meus caros. Depois, já há novos cronistas na praça, melhores e mais assertivos, nestes tempos de iPad. Ainda, porque um homem, já aos cinquenta, precisa fechar-se em balanço e escrever coisas de monta e de mais transcendência. Finalmente, o mundo sendo isso, não é isto e o tempo, sendo agora, pode nem ser aqui. Por ora, não garanto continuar por muito tempo. A única certeza (ou se calhar nem isso, ora bolas): ser a terra, um paradoxo às voltas. Continuo a gostar do pôr-do-sol, juro. Continuo também a chorar pelas madrugadas, palavra. E a ter espasmos de emoção quando o texto é Pessoa, acreditem. Já nem falo de amar, já que o amor, tal qual o oxigénio para respirar, é que nos tem a suspirar. Qualquer dia saio por aí a disparar…poesia, naturalmente.</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Manifesto apoio</span></strong></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Assinei, com mais de cem outros artistas e criadores, um Manifesto de Apoio a José Maria Neves. Democracia é podermos livremente escolher quem apoiamos. Naturalmente que o meu voto é íntimo, secreto e sagrado. Mas a minha escolha é pública, aberta e consequente. Quero, que se mantenha na governação, alguém com um portfolio de realização invejável e com uma capacidade real para aprofundar a transformação de Cabo Verde. Não entro aqui no que foi feito ou não foi feito ainda no sector da Cultura. Até porque o meu apoio nunca seria cego e acrítico. Jamais seria militante incondicional de nada, como não poderia ser devoto e beato, quase besta, de joelhos pelos altares. Tão pouco faria vénias, mesuras, simpatias de carregar pastas ao patrão, essas coisas de tanso. O meu apoio é consequente, comparativo e consciente. De quem se afina num projecto maior, não tanto pela rama e pela fisiologia partidária, de que transformar Cabo Verde (bem à glosa de Amílcar Cabral) seja um acto de Cultura. Nessa linha, José Maria Neves sabe ao que veio: ser esse «simples africano» e fazer de Cabo Verde esta coisa um pouco mais respeitável, soberana e digna. Pessoalmente, sinto algum engulho no estômago por essa subserviência neocolonial e patusca de certa gente. Por isso, culturalmente vai o meu grande abraço, de simples cidadão, para José Maria Neves! </span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><strong><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Deus nos guarde dos guardas </span></strong></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><br />
</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Arre, que não há nada mais eficaz para acabar com uma utopia do que ver a guarda municipal, bem fardada e de cassetete (mas para quê se a função era de coimar apenas?), a enxotar vendedores ambulantes pelas ruas nas barbas caras dos cambistas do euro, do dólar, do franco suíço e do que mais queiram. O porquê de se enxotar uns e de permitir outros arrasa qualquer quimera. Arre, que não há nada que revolta tanto como o abuso e a discriminação. Transigência para uns e intransigência para outros em plena Avenida Amílcar Cabral. Constatar que o dito cujo, a fazer as vezes de um polícia mesmo à sério, já vem instruído para sorrir a estes (os do mercado negro) e para dar caça a aqueles (os do mercado informal). Estaremos perante o indício de uma nova ordem que determina quais os ambulantes aceitos? Ou apenas de uma desordem ainda tímida, impondo regras de iniquidade à cidade? Não que me desgoste a fiscalização mais intensa e sistemática das boas práticas nesta autarquia ainda a ser (vagarosa e socialmente) municipal. Nem que me arrepie a reafirmação da postura municipal, instaurada entre os fundamentais da cidadania local. Mas uma coisa é postura, outra a impostura. Por isso, enxotar a todos ou a ninguém nos passeios do Plateau. Arre, que as milícias de camisas castanhas (essas merdices paramilitares), noutro local e noutro tempo, assim começaram a esboçar a «orgia do poder» …</span></div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-54242591843726813902011-01-24T15:35:00.000-08:002011-01-24T15:35:01.918-08:001/8C+(D-d) 3/8xTI MxNA<div style="text-align: justify;"><strong>De insana febre</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Azafamado dia, de não sei que santo, mas que não me deixa flutuar sobre as perguntas transcendentes. Logo eu fazendo anos. Por que este receio de romper com as coisas estabelecidas, obtidas, creio eu, por ventura, e de me recomeçar como o mais absoluto zero à esquerda? Não cairá por isso sobre mim o manto da sabedoria. Nem fará de mim estrela de algum ocaso sem fim o estar ainda aqui. A límpida lucidez que amanha o ser em certa idade, em mim ainda tarda, embora já não sinta a fruta em seu gosto inteiro, nem pressinta o cio em seu pleno gozo. De vez em quando, penso que a minha vida chafurda mesmo no signo do aquário. Um existencialismo aquoso. De peixe a crescer e a ficar, claustrofóbico, neste aquário. De fazer cinquenta anos, contados, e saber que tudo se acaba afinal de insana febre. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Em campanha</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Por cá, os ânimos estão exaltados por causa das eleições legislativas. Até os bons amigos ficam desavindos e ainda bem que é temporário. O berreiro dos carros de som incomoda-me. Não tenho vida para esse extravasar da má-língua e esse desprezar cautelas. Bem que gostaria que não se transformasse este lugar no reino demagógico dos acéfalos. Por mim, avançava-se o cronómetro e acabava-se logo com isto. Que chatice. Só espero que não haja prolongamentos, essa gritaria de fraude e outros disparates, que a malta anda estafada dessas coisas, e a hora, convenhamos, é de fazer, fazer, fazer…Cabo Verde. Aqui, e “en passant”, ficará dito que os partidos não são todos iguais. Há diferenças de forma e de fundo. Há quem se empenhe a transformar Cabo Verde. Mas também há quem insista a desiludir até nisto. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Deprimente dia</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Cliff Arnall, psicólogo, chegara a uma fórmula lixada para dizer que 24 de Janeiro, dia dos meus anos, é o mais deprimente do ano. Raio de coisa esta fórmula 1/8C+(D-d) 3/8xTI MxNA. O Pranchinha, abusado de primeira apanha, diz que “C” tem a ver com o factor climático (logo em Janeiro, sendo os dias mais frios), “D” as dívidas pelos gastos do Natal, o “d” significa as despesas de Janeiro e o “T” é o tempo de «sofrimento» do Natal a esta «data querida». A letra “I” é tentativa falhada de abandonar um mau hábito…E “M” resulta das motivações individuais e “NA” a necessidade de mudar de vida. Nas antípodas a esta “data querida”, o dia 20 de Junho. Não queria estar em nada disto, senão ficar aqui horas esquecidas a jogar conversa fora. Cada momento, sendo único, é uma pérola a não se desperdiçar. Fórmulas à parte…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-3630503853427071932011-01-10T04:43:00.000-08:002011-01-10T04:43:40.708-08:00Impossibilidade de se estar noutra alma<div style="text-align: right;"><em>(Não ficarei em silêncio, porque me é totalmente impossível estar noutra alma. Estávamos a almoçar no Hotel Porto Grande e me recordaste ter sido sempre um «pássaro turbulento». Eu também quis que te lembrasses da primeira tertúlia e falavas, já ao tempo, da exegese para a literatura cabo-verdiana. Creio que aquele tempo fora, de alguma forma, pródigo e marcante. Nenhum silêncio é igual ao outro. Mas, acredita, estarmos sempre juntos. Para além do gentílico de sermos cabo-verdianos, a caboverdianidade que nos detém) </em></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Me_xendo no Baú</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">O reencontro com Luís Geraldes, artista plástico português, radicado na Austrália, foi uma festa. Em como a poética acasala-se com a plástica. Em como as nossas energias plasmam-se para a explosão cósmica e ontológica, deixando cair no terreno da Arte a poeira existencial das nossas vidas. Em como no cruzar dos nossos tempos, cruzam-se também os nossos olhares, os nossos afectos, as nossas sinas, as nossas misérias e as nossas exuberâncias. Em como eu, de pasmo e de admirado, olho para os quadros de Luís Geraldes. Em como ele, de calado e de mirado, escuta os versos meus que, com hífenes pelo meio, lhe emprestam viagens labirínticas. O projecto chama-se «Me_xendo no Baú. Vasculhando o U», envolvendo a dramaturgia e a recitação de João Branco e Nancy Vieira, e requerendo, em surpresa, que os versos (sem música aparente, mas ulterior, desse U a vasculhar, diria) sejam dançados por um corpo. <em>Reptiliano</em> corpo atomizado pela alma… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Costa do Marfim</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Há leituras diferentes sobre os actos da política externa cabo-verdiana. Ainda que se deseje uma convergência e um sentido de «mainstream» na diplomacia, é salutar que haja visões diferentes. Sem crise. Aplaude-se a tentativa ao mais alto nível da diplomacia cabo-verdiana em participar da paz e da estabilidade na Costa do Marfim. O esforço do Presidente da República merece o aplauso daqueles que se apercebem dos alcances visíveis e invisíveis da política externa e da «missão estratégica» de cada acto em relação à sub-região da África Ocidental. Para além dos resultados «plausíveis» da missão, reafirma-se com ela um Cabo Verde como «país útil» (e necessário) na arena internacional e não mera caixa de ressonância e/ou base logística para as diplomacias de ponta a ponta. Tal como outrora, ao Cabo Verde que já desempenhou um papel relevante na resolução e manutenção da Paz na África Austral, agora é-lhe crucial o protagonismo nesta sub-região em que apenas uma análise estrutural avulsa não reconhece a sua importância. Lá voltaríamos aos olhares sobre os moinhos, bem à maneira de Cervantes: Alonjo Quijano, Dom Quixote de la Mancha, via-os como monstros, mas Sancho Pança, deles, só descortinava os moedores de cereal. Saibamos nestas antípodas dos olhares, fazer as nossas leituras… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Frio de Lisboa</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Frio de Lisboa, calafrio de estar longe, enquanto um monstro, pior que a cabala, tenta engolir alguém que me é próximo. Este monstro – chamemo-lo pelo nome – é a Justiça, em paragens nossas, mais meretriz que senhora, vendendo-se pelas margens e conspirando-se pela calada, como se as virtudes deixassem, entre nós, de já fazer sentido. O Governo faz reformas, investe em mudanças e agiliza circuitos, mas o corpo permanece corrupto, podre e ao serviço da besta. É o corpo delito, de um delito maior e transbordante. E o terrível disto tudo seria ficarmos quedos, quietos e a medo, incapazes de cidadania e presos por um fio pelo embaraço de falarmos as duras verdades à cara dos senhores da toga. A que isso terá chegado! A quantas vai a tolerância do cidadão em relação à ignominia! </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Em campanha</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Passando estes tempos, haverá um País que continua. O pessoal prepara-se para uma campanha pobre em ideias, mas rica em cartazes gigantes e em carros de som. Os ideólogos dão lugar aos publicitários e as plataformas eleitorais são trocadas por camisolas coloridas. O importante não será a escolha consciente, mas o voto cabresto – umas vezes, por engano, outras vezes, por engodo, quase sempre, por propaganda. Agora me lembrei daquele amigo, anarquista até dizer chega, que rezava nestes termos: se o voto é a arma do povo, é preciso não votar para que o povo não fique desarmado. Eu já não penso assim. Voto sim. Mais Cabo Verde. Não me conformo com a «coisificação» de certas estratégias. Nem fico neutro à queda de braços entre uns e outros. Cidadão, sei o que (não) quero…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: right;"><em>(Ser-se cabo-verdiano é uma condição além da gentílica (e quem o é, sabe que tenho toda a razão). Direi, por isso, com todos os efes-e-erres que não é fácil ter pele do outro, quando nos seria totalmente impossível estar-se noutra alma) </em></div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-4945995698710769642011-01-04T03:28:00.000-08:002011-01-04T03:28:13.928-08:00Já que é Ano novo<div style="text-align: justify;"><strong>Impossível paisagem</strong></div><div style="text-align: justify;"></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Agora, que é Ano novo, eis-me à tentação de prognóstico ou mesmo de resolução premente. Pulsa-me a vontade de olhar para os dias a virem, com crença e fé, mas não aquela que, embevecida, se dilui pela água das causas, nem aquele que, de ardente, se ajoelha diante dos altares da vida. Pulsa-me a vontade tão-somente legítima de ou para as coisas mais simples: a paz de espírito, o ser melhor que antes e o conceder-me à arte. Sem alarde, que é já tarde, para o homem de cinquenta. Claro que não é hora da paragem. Sendo certo o halo desse incenso pela sala e cristalino o espelho no quarto em que me olho, prefiro o remanso à voragem. Mil vezes a viagem silenciosa que a ruidosa permanência. A errância dos poetas que, diante dos reis e dos precipícios, nem se precipitam. A transigência dos poetas em tempo de rio. Rio-me disso tudo. Mirante que sou de uma paisagem impossível…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Sonho em retrato</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Livre do seu enleio, sério do que não é, como diria Fernando Pessoa, assim me apercebi deste livro «O Retrato de Um Sonho», de Fábio Vieira, que, de pronto, se acomete a reminiscências e a buscas existenciais para o seu próprio reencontro através da escrita. O romance, enquanto «isto» literário, não tem tido tradição afortunada em Cabo Verde. Entretanto, esta nova geração de escritores, à qual pertence Fábio Vieira começa a marcar espaço neste género literário e a inscrever o romance – romance moderno, em toda a acepção – na vigorosa literatura cabo-verdiana, madura e prestigiada em se tratando da causa poética. Na construção da sua narrativa, parte o autor de um argumento que ultrapassa até a projecção do enredo. Conta-nos a história de um jovem cabo-verdiano, da ilha do Fogo que, ao final de inúmeras andanças a marinhagens, regressa sempre ao seu ponto de partida para se encontrar de forma mais pródiga, sendo a itinerância, mais que a reminiscência o fio condutor da sua narrativa.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Restaurante Avis</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Reabre, na cidade da Praia, mais precisamente na glamourosa rua pedonal do Plateau, 5 de Julho, o restaurante Avis. Reabre com classe e intenção. Com ambição, cheirando a novo, sem recusar a sua áurea de um passado em que fora o melhor restaurante da capital. A sua gerência pensa adendar à restauração uma «agenda cultural». Música, como prato cultural forte. Mas também outras valências criativas que esta cidade potencia. Em conversa com o amigo Vito – Leitão da Graça -, um dos emblemáticos do Plateau, ficou-me a impressão de que é possível de restituir ao nome Avis, marca já mais que registada, a sua vocação de espaço de Cultura. Iniciativas do tipo merecem o aplauso de todos, pois transcendem o negócio e afirmam uma nova cidadania. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Agenda verde</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Regozijamo-nos com o facto de um partido político incorporar a «agenda verde» no temário da formulação de novas respostas para os novos tempos. Aliás, alguns de nós temos reflectido séria e criticamente sobre a necessidade de uma «terceira força» efectiva, plasmada na causa ambiental e no desenvolvimento harmonioso. Essa «agenda verde» se assentaria em três eixos: o desempenho económico, a qualidade de vida e a sustentabilidade ambiental. Ao «incorporar» tal agenda, continuaremos a votar nesse partido, sem que haja necessidade de desviarmos o voto. Ressalva para dizermos que voto lúcido, consciente e crítico. Não somos eleitores de votar pelo carnaval da propaganda e do marketing. No nosso caso será um mais um voto de confiança, tendo em conta a carteira de realizações e a realidade das transformações. Mais do que isso, tendo em conta o potencial das mudanças ainda possíveis e passíveis de implementar. Isentos no descrever as coisas, mas jamais neutros em pensamento, continuaremos juntos a trabalhar o futuro.</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-25968277455706947252010-12-27T02:55:00.000-08:002010-12-27T02:55:44.847-08:00IMPRESCINDÍVEL HINO<strong>Do irrecusável hino que nos faz sonhar</strong><br />
<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Com tristeza, soubemos do falecimento de Norberto Tavares, de quem éramos amigos e por quem tínhamos enorme admiração. Admirávamos nele o talento artístico e a convicção com que encarava Cabo Verde no Mundo; a forma generosa, mas crítica, com que se permitia às coisas instituídas, quase sempre alienantes. E a nossa amizade por ele se fundamentava na abertura do espírito e na cordialidade no abordar tudo, inclusive os assuntos mais triviais. Quando lançara há muito, muito tempo, o álbum “Volta pa fonte”, afirmação cultural e cidadã de singular transcendência, Norberto Tavares assegurara o seu assento (tónico acento, diga-se de passagem) no panteão dos músicos de Cabo Verde. O seu diferencial rítmico, melódico e poético, bem como semântico, estava ali para ficar e marcar várias gerações sobre a necessidade de se modernizar pelo afirmar das origens e da identidade. A metáfora do amor à mítica Maria, de lata de água à cabeça, palmilhando os caminhos da fonte, continua a marcar o nosso imaginário e a determinar a nossa férrea vontade de mais Caboverdianidade. Saudamos o amigo Manuel Veiga que, então ministro da Cultura, rebaptizou, na Cidade da Assomada, o Centro Cultural Norberto Tavares. Saudamos também o cidadão Carlos Tavares, emigrante nos Estados Unidos da América que doou um rim a Norberto Tavares numa arriscada operação de transplante. E gostaríamos que, por ocasião do 35º Aniversário da Independência Nacional, Norberto Tavares recebesse a condecoração do 1º Grau da Ordem do Vulcão, entre tantos artistas agraciados. Afinal, tratava-se do autor de “Nos Cabo Verde de Esperança”, irrecusável hino que nos faz sonhar!</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Eleições com rosinha e outros que tais</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Prepara-se a procissão para sair do adro. Em verdade, os cães, por sacrilégio, de há muito latiram ao latinório. Egrégio momento, não fosse esse de promessas vãs e de sacos de cimento por votos. Pela missa, presumem-se raios e coriscos, que tal areal, quando entrado pela rua, ninguém o segura. Enxurrada de povo, dir-se-ia a de água, é coisa mesmo séria. Povo desaguando no estuário do processo histérico. Já se viu isso antes, primeiro, ao tempo em que acreditávamos na revolução e, depois, ao tempo em que embarcamos na democracia. Agora, somos mais lúcidos. Menos bentos com a República. Ninguém faz vénias aos venais. Ou faz? Eleições com rosinha e outros que tais desafinam qualquer um. É nosso caso. Por modo que descrer nas manhãs que cantam e essas lerdas é também uma forma de ser e de estar em tudo. Ou, consequentemente, em nada. De sorte, sendo sempre cidadão, é-se poeta consequente. Apoiando causas, verte-se o suor e derrama-se o sangue, como se expressa em palavra, mas não se matricula para o exame da polis. Há uma direita sinistra que se disfarça e se recauchuta, mas que, trocada por miúdos, não engana mais ninguém. É preciso dar-lhe luta...antes que anoiteça.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>O Processo</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Lia-se Kafka, pela derradeira vez. Vasculhava-se n´ “O Processo”, a ver se o que acontece por cá era menos absurda que a sorte de K, julgado e condenado por uma engrenagem maior e invisível. Onde é que já se viu o Estado de Direito Democrático, que se arvora atento aos Direitos Humanos e tudo, permitir confissão de preso sob tortura ou sob efeito de droga? Ou de acção processual acelerar-se por interesse de um acusador público, subvencionado claramente por um maquiavélico comerciante da praça? Ou mesmo a promiscua relação entre uma testemunha, entretanto reclusa de outro crime, receber de um procurador o livro de Dan Brown, simulacro de alguma corrupção ou chave de um mistério que, a todos os títulos se revela promíscuo, senão mesmo corrupto? Pior do que isso, a escala de um juiz da mafiosa<em> troika</em> – ficando ainda a recorrente pergunta de quem julgará os juizes – para ajuizar um jogo de cartas marcadas e de trunfos na manga. E, ante que anoiteça, é preciso lhe dar luta...</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>2011</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Ei-lo à porta. É hora de nele entrarmos. De forma nova e inovada. Sem a corrupção da Justiça. As grandes questões do nosso tempo serão: uma agenda verde para Cabo Verde, uma agenda de economia da cultura e uma agenda da economia solidária. Por um desenvolvimento sustentável...porque um mundo melhor é possível. Ademais, meus caros, muito paz, muito axé, sarava & morabeza!</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-4818040353594755682010-12-20T01:48:00.000-08:002010-12-20T01:49:38.181-08:00Crónica de Natal<span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><strong>Crónica de Natal</strong></span><br />
<span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Em tempo de Natal, está-se com a sensibilidade mais desperta, tão desperta e aflorada, que não se consegue fazer uma crónica normal. Ainda que livre, escorreita e navegável, a crónica exige alguma racionalidade e não se confina ao velejar pelo oceano incerto, ora para o sotavento, ora para o barlavento, havendo esse mar azul para o sem porto de alguma chegada. Naturalmente que, tal o pensamento, serei sempre livre para escrever sobre a trivialidade das compras de Natal, como se a natividade de Jesus fosse uma conspiração capitalista em que até os «condenados da terra», mercê do regabofe e da consoada, se empilham na procissão do consumismo. Poderei também, já que o sentimento é mente mais que coração, discorrer sobre a paz, a reforçar, e a fé, que nunca morre, de a campanha eleitoral aí à porta não se resvalar para a crispação, ditame de uma baixíssima política. Não podendo fazer crónica normal, posto haver sempre a tristeza da ausência da minha mãe, estúpida lei da vida alguns não terem mãe pelo Natal, fica daqui para o meu leitorado (<em>menos, Filinto Elísio, muito menos, companheiro</em>) um abraço pela fidelidade e uma certeza de não me terem de aturar, como cronista, em próximo futuro. </span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><strong>Toalha de mesa de Natal</strong></span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Até o simples halo, suspiro de nada, é poesia,</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">teu olhar de passagem, coisas assim fugazes,</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">não precisam ter luz, apenas sombra, que encantam.</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Às vezes, é um dizer marginal, teu subtexto somente,</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">pois o não dito diz tudo, mais que o suposto. É cotovia</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">pelo modo que canta e pela moda que voa, seu esvoaçar.</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Outras vezes, é vento que bole, tão breve que leve a folha.</span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Nuance de vinho na rolha, a telha, grená, de argilosa,</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">tanta lembrança que lhe trança o linho, toalha de mesa</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">eis o Natal agora sem ti ao brilho desta Árvore,</span></div><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">e ao que te soletraria perdido, em lágrima, poesia!</span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><strong>Em tempo de campanha</strong></span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Leio, com indignação, o que um jornal nos permite só porque estamos «em tempo de campanha». Em democracia, a imprensa é livre, mas não pode tudo. Nenhum poder pode tudo, aliás. Até o Parlamento se incorre à dissolução e o Presidente ao «impeachment», bem como o juiz pode ser julgado. Só em regime fascista e/ou totalitário aparece uma imprensa (próxima aos «iluminados») sem limites. Ademais, sem uma imprensa voltada à formação de opinião, capaz de fornecer informação confiável e comentário preciso, o próprio Estado democrático pode acabar avariado, escreveu o filósofo alemão Jürgen Habermas. Afora a «boutade» dessa pasquinada em formato de jornal, e já agora não se deveria também permitir campanha eleitoral, com carro de som (<em>que não pode tudo, carago</em>), à porta da Maternidade, o Natal vai entrando e se entranhando aqui aos poucos. </span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"><strong>Personalidade do ano</strong></span></div><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;"></span><br />
<div style="text-align: justify;"><span style="font-family: Georgia, "Times New Roman", serif;">Um dos disparates (e não são poucos) da imprensa é escolher, nesta altura, as personalidades do ano. Pior do que isso, só certas condecorações em que os medíocres distribuem o «faz de conta» em detrimento do real mérito. Entrementes, este ano, igualmente por estarmos em tal tempo, não se melindre a airosinha CNE, a imprensa não deveria escolher fulano, beltrano ou sicrano para o «faz de conta», até porque a personalidade do ano parece ser claramente Julian Assenge, com o seu blog <em>Wikileaks</em>. Os vazamentos de documentos confidenciais, não só revelam os meandros de como se enformam decisões, como informam à nova sociedade civil global sobre as teias urdidas neste mundo, em que nunca Maquiavel foi tão actual.</span></div><br />
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</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-11151346499613400622010-12-15T04:46:00.000-08:002010-12-15T04:46:00.284-08:00Temporão<div style="text-align: justify;"><strong>Temporão </strong></div><div style="text-align: justify;"></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Essa versão da democracia como a panaceia dos nossos males da alma? Essa política da raiva, do fel e do agressivo? Essa espécie de «cloaca máxima», que em Roma Antiga drenava os esgotos, aqui aos do pensamento? Não me façam rir. Esse discurso cartesiano, da lógica barata, da ladainha de sempre? Convenhamos que merecíamos melhor neste tempo de estio. Acreditá-lo nem por isso. Tão pouco creditá-lo. O Livro diria: «tanta vaidade e o vento que passa». Aplaudo a retirada dos outdoors, todavia. Ao menos isso, companheiros. Eram feios, sovinas e avarentos. De enorme mau gosto. O pessoal não aprendeu que a estética poderá fazer parte da política. Ou talvez pense que somos «o admirável gado novo». Uns simplórios que se satisfazem com a vulgata. Em verdade, não o somos, acreditem…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Quando se alvoroça</strong> </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Às vezes, na quietude, o alvoroço destas árvores. São as acácias da minha rua, umas antigas, outras nem tanto. As de outrora me recordam a infância (tua trança ali, primeva transa acolá). E as de agora, se calhar por noviças, nem de alhures me lembrariam a nada. Se te contasse dos malucos do meu tempo: Bernas que também era epiléptico; Fátima Doida, elíptica como ninguém; Soraya, olhos grandes e perfume de eucalipto. Mas não, eles agora inexistem e o texto, sempre fora do contexto, reedita as suas sombras. Deve ser do troço de tais árvores. Ou arvora-se em tua face o corte diagonal do tempo. Sabias que a neblina não é inocência em estado puro? Tudo se liquefaz – do retrato de Che à Constituição Nacional, passando, naturalmente, por esses altares de se ajoelhar. E faz-se lua. Algo mais que o luar. Enluarar pode ser o infinitivo de assaz verbo. Quão intransitivo. É mais do que se fazer à lua. É ela, toda nua, a fazer-se em mim. Um dia, tu vais entender… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>De vez em quando</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Apanha-me deste lado o fastio ao passear por estas ruas. Acontece-me, assumindo amar cada esquina e cada luz ensombradas, por tão lúgubre raiar, que se incendeia hoje aos homens da cidade. Apanha-me deste lado a náusea de encorpar essa pasmaceira com que as horas vão pingando, torneira a gotejar em dia de água, ora à míngua de luz eléctrica, ora à bonança de um estio reinante. Haverá gente, que não este a escrever, resignada ao paulatino assalto dos facínoras. Gente resultante do que, à 25ª hora, se ordenha diria que de fartos benesses e doutros agrados de quem ordena. Apanha-me deste lado o que, por pudor e recato, se recusa a gritar em mim. Tempo pródigo de sair por aí…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-67829547110833132602010-12-06T04:32:00.000-08:002010-12-06T06:02:45.150-08:00INFERNAL OUTRO: ESSE MISTÉRIO<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"></div><div style="text-align: right;">«Tenho o micróbio da liberdade e da escolha ardendo em minhas veias»</div><div style="text-align: right;">Airton Monte</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Céus, que há seca na Amazónia</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">De vez em quando, vendo o noticiário pela televisão, reparo que o mundo não está saudável. Ao meu lado, o meu pai pergunta: «É o planeta que não está bem ou somos nós que agora sabemos de todas as suas mazelas?». Cogito ser isto e aquilo, as duas coisas. Gilberto Gil, músico e sábio, diria que hoje a Terra é pequena, porque o Mundo tornou-se grande. Nas antípodas, o Mundo antes era pequeno, quando enorme era a Terra. Talvez seja isso. Entrementes, a variável da depredação ambiental terá enfurecido o planeta e a Europa neva antes do tempo, os furacões perdem o seu norte e as enchentes perigam a Austrália. Céus, que há seca na Amazónia! Outrossim, o sistema de informação dos Estados Unidos, como outrora o seu sistema de segurança à fúria do Ben Laden, desmorona-se à «pirataria electrónica» da Wikileakes e já não se entende mais nada. O que afinal se revela é o que todos sabíamos e o que todos os países e estados, dignos do nome, fazem: cuidam da sua «inteligência», dão seguimento à agenda do Outro. E Jean-Paul Sartre ensinava: «O inferno é o Outro». Nada mais evidente e assertivo. Debalde, em Cabo Verde entrámos na corrida eleitoral. Espera-se, sem ilusões, que a disputa pelo voto se faça com lisura, com candura e com responsabilidade. Não que haja razão objectiva para esperar tanto civismo, mas, que diabo, a esperança não morre e, um dia, o pessoal há-de perceber que o «infernal Outro» fundamenta a Democracia. Não é a Constituição que se copia, o modus operandis que se importa, mas a Cultura de ser e de estar perante o «infernal Outro» que existencializa a Democracia. Espera-se, sem ingenuidades, que o pessoal entenda a sabedoria guevariana de «endurecer-se sem perder a ternura». Vale a pena tentar, pois que o mundo não está saudável. O pequeno mundo destas ilhas deve sofrer de hipertensão, de esquizofrenia, essas coisas. De repente, a barra pesa e o bicho pega. E quanto à pergunta do meu pai: «É o planeta que não está bem ou somos nós que agora sabemos de todas as suas mazelas»…os deuses devem estar loucos!</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Eis que o dia amanhece azul</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Dou o meu modestíssimo contributo para coordenar a edição do livro de um «velho amigo». Aprendo muito em reler os seus textos e apercebo-me que, como nos ensinou Amílcar Cabral em «A Arma da Teoria», importa teorizar sobre a caminhada prática, sendo mister, por motivos de precedência e de providência, conceber a relação, senão mesmo a interacção, dialéctica entre a teoria e a prática. Há uma prática transformacional em Cabo Verde e problematizá-la, com ciência e consciência, tornou-se o desafio do momento. Encanta-me neste livro a visão sobre os desafios do futuro. É de alguém que já leu e matutou profundamente sobre «Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro», de Edgar Morin. Implicitamente, há nestes textos, o aprendizado de uma navegação por um oceano de incertezas para transformar Cabo Verde num arquipélago de certezas. Para que os dias nos amanheçam azuis…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Longeva idade</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Gosto, porque me acalma, ficar na quietude (e no arfar) de quem se ama, escutando a vital batida do seu coração. E de pensar como gostaria ela de escutar um poema de Mia Couto. Pode ser esse que, bem sussurrado, reza: </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><em>Da velhice </em></div><div style="text-align: justify;"><em>sempre invejei</em></div><div style="text-align: justify;"><em>o adormecer</em></div><div style="text-align: justify;"><em>no meio de conversa.</em></div><div style="text-align: justify;"><em><br />
</em></div><div style="text-align: justify;"><em>Esse descer de pálpebra</em></div><div style="text-align: justify;"><em>não é idade nem cansaço.</em></div><div style="text-align: justify;"><em><br />
</em></div><div style="text-align: justify;"><em>Fazer da palavra um embalo</em></div><div style="text-align: justify;"><em>é o mais puro e apurado</em></div><div style="text-align: justify;"><em>senso da poesia.</em></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Pensar que o ser humano, este mistério simultaneamente físico, biológico, psíquico, cultural, social e histórico, grande dádiva da Natureza, merece a paz, o amor e a bem-aventurança. Meço a tensão arterial, tomo os meus comprimidinhos e arranco o dia com uma marcha pelo quarteirão, um banho frio e uma banana. Entra-me, sem pedir licença no pensamento, a frase de Freud: «Se decidir parar de fumar, de beber e de fazer amor, na verdade não viverá mais tempo; é a vida que lhe parecerá mais longa». Fumar não recomendava, beber só moderadamente e fazer amor, sendo na quietude (e no arfar), é a terapia da longeva idade. Poesia. Qualidade de vida…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-20795777901775967252010-11-30T01:15:00.000-08:002010-11-30T01:20:42.699-08:00Dos livros<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Sequestro existencial</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Dois livros me encantaram pela desmistificação do poder dos homens e pela essencialidade humana - «Os Sequestrados de Altona», drama de Jean-Paul Sartre, e «Ninguém Escreve ao Coronel», romance de Gabriel Garcia Marquez. Ambos radicalizam a forma como os homens (não) sabem ser e estar diante do poder (político, económico, social, religioso, outro). A metáfora da <em>miséria orgulhosa</em> do Coronel é paradigma dos homens em face ao destino. Diante do calvário de nascermos iguais e da democraticidade de morrermos todos, o intervalo em que vivemos é de si uma dialéctica no olhar dos outros. E no nosso olhar ao próprio espelho. Em verdade, somos sequestrados da vida, na sua luz e sombra. E em tese, ninguém é diabo ou santo. Todos somos (tão frágeis) dramaticamente humanos. Com o vosso perdão por este intróito de anti-História. Ou apenas este rasgo de<em> estórias</em> que vão compondo a História. Ou, ainda, vice-versa…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Valorizando a História</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Faz bem ler pela madrugada, quando já anda tudo a dormir. Faz bem, esquecido das horas e das desoras, remoer páginas inteiras no barulho monocórdico de um relógio. Petit bruit, como diria alguém que me sussurra o espírito. Remoer livros. Por estes dias, tenho estado a ler um livro de Laurentino Gomes. Intitula-se «1822» e conta <em>estórias</em> de um período muito especial da História do Brasil. Talvez por ter contado estórias, o livro se tornou num <em>best-seller</em>. Tornando coloquial, senão mesmo banal, feitos que afinal nem foram factos e criando interesse por figuras que a oficialidade às vezes recusa, a obra de Laurentino Gomes marca o seu espaço editorial pela linguagem discursiva e pelo fino, quase imperceptível, recorte humorístico. Pessoalmente, o texto prende a minha atenção pelos detalhes da época (século XIX, no caso), algo que também captei na releitura de «O Senhor das Ilhas», de Isabel Barreno, e de «A Morte do Ouvidor, de Germano Almeida». Estes também contam <em>estórias</em>. Valorizando a História… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Máscaras dos outros</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Li também, com vivo interesse, «Máscaras de Salazar», de Fernando Dacosta, e confesso que me fascinou saber o lado humano do ditador português. O homem que, por trás do sombrio e do retrógrado regime imposto a Portugal, soube ser casto e humilde, impondo-se a si próprio um viver sob valores do patriotismo e da família. Naturalmente que, em seus auspícios, floresceram a polícia política mais grosseira e a Concordata que lembrava à Inquisição, com perseguição de cidadãos e aberturas de prisões, de que o Campo de Concentração do Tarrafal é o mais gritante exemplo. Todavia, há também <em>estórias</em> com interesse para além da História, sendo esta, quase sempre, o <em>karma</em> dos contemporâneos. Com mais distanciamento, havemos de encarar António Oliveira Salazar com o desapego emocional (e, quem sabe, sem raiva) com que encaramos o Marquês de Pombal. Admirando-lhe a estátua, eixo distribuidor de Lisboa, encantadora cidade…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Antropomórfico tão-somente</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Tudo isso me fez lembrar Lani Guinier, politóloga e autora do inultrapassável livro «Tirania da Maioria», algo que se recomenda à nossa política local. Ela recomendava, apesar de tudo, a releitura da História sem assomos da emoção, nem despiques ideológicos. Qual o encanto de passearmos pela <em>Via del Fiori Imperiale</em> e pararmos, deslumbrados, diante do Coliseu, se os Césares foram o piorio em termos de práticas humanas. Basta lembrarmos Nero e Calígula, entre tantos. Afinal, a figura do temível e sanguinário Napoleão Bonaparte, hoje valorizado pela França democrática, não teria o brilho toponímico e efeméride, nem contribuiria para engrandecer o País. Outrossim, Thomas Jefferson, à sombra do seu genial espírito libertário, foi senhor de escravos e Winston Churchill, símbolo da resistência ao nazismo galopante, era um colonialista de primeira e os colonizados do Império Britânico viviam sob a indignidade e servidão. Há que contar <em>estórias</em> para que a História se proceda, sem fatalismo, mas com o seu inexorável sentido antropomórfico, inclusive de ser o homem o lobo do homem…</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-74794323333741787272010-11-22T13:06:00.000-08:002010-11-22T13:13:26.557-08:00Tempo, tempo, tempo, tempo (III)<div class="MsoBodyText"><br />
</div><div class="MsoBodyText" style="text-align: justify;"><br />
</div><div></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><b><span style="font-size: small;">Remanso</span></b></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: right;"><span style="font-size: small;"><i><span style="font-weight: normal;">ter um livro para ler</span></i></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: right;"><span style="font-size: small;"><i><span style="font-weight: normal;">e não o fazer</span></i></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: right;"><span style="font-size: small;"><i>Fernando Pessoa</i></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;"><span style="font-weight: normal;">Aprende-se que ficar na rede (sem pensar em nada), nessa metafísica bastante e bem pessoana, é uma delícia. Balançar, mas ao de leve, não fosse o cronista, em desarranjo, transmutar o bulício da vida. O desassossego apenas e tão-somente de ouvir a morna “Mar Azul”, com Cesária Évora e Marisa Monte. Ao tempo dos alquimistas, o engenho e a arte eram uma só ciência. Tenhamos consciência disso. E o pensamento, como outrora, sendo afago do remanso. E, se tanto, de a voz, que será tua, a recitar uns versos de Adélia Prado. Uma delícia, carícia quase...</span></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;"><b>Cronista </b></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;"><span style="font-weight: normal;">Está na cara que não é nada fácil a vida de cronista em Cabo Verde. Não deve ser fácil o metier em qualquer outra parte. O condicionamento dos outros. A alteridade em nós e nos outros. O caos das identidades. As transposições, as leituras transfronteiriças. Uns querem ler crónicas de “belas letras”, com floreios literários ou de novela, e nem sempre tenho pachorra para escritor. Outros demandam que afronte a vida política nacional e dê opinião sobre isto ou aquilo, este ou aquele, o que cada vez menos me anima. Quando não se espera de mim coisas mais estapafúrdias, como seu eu tivesse compromissos com a chatice do processo histórico. Não é raro sentir-me como uma arma de arremesso, karma dura e neurótica. E eu que apenas queria escrever, a cada momento, o desvão das minhas lembranças?</span></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><b><span style="font-size: small;">Património Imaterial</span></b></div><div class="MsoBodyText" style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;">Cabo Verde, que tem na Cidade Velha um lugar classificado como Património Universal da Humanidade, poderá ter outros sítios com tal estatuto: o antigo Campo de Concentração do Tarrafal. Ou, então, a Cidade de São Filipe. Ou, ainda, a Baía do Porto Grande. Mas também poderia candidatar-se ao reconhecimento da Unesco com a Morna, o Batuque ou a Tabanka. Candidatar-se ao Património Imaterial da Humanidade, mais precisamente. Quem sabe, se com a secular técnica de feitura da aguardente de cana. Ou com as Bandeiras do Fogo. É tudo uma questão de atitude. E, sobretudo, da capacidade de argumentação sobre os valores excepcionais e diferenciais dessas manifestações culturais e de como se integrar a um selecto grupo de 232 monumentos “intangíveis”. Na semana passada, uma quarentena de actividades tradicionais ganhou o status de património da humanidade da Unesco, entre elas a acupunctura chinesa, o flamenco espanhol, a arte de domar falcões na Mongólia e a de produzir biscoitos de gengibre na Croácia. Chegou a hora de pensarmos em tudo isso...</span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;"><b>Brasil – Cabo Verde</b></span></div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><br />
</div><div style="font-family: "Trebuchet MS",sans-serif; text-align: justify;"><span style="font-size: small;"><span lang="EN-GB">Leio (e recomendo) a leitura de “1822”, de Laurentino Gomes. As circunstâncias da Independência do Brasil remetem de alguma forma ao passado em Cabo Verde, nesse mesmo período. Entendendo esse recuo, entenderemos outras realidades que são nossas e que se desfiam, incógnitas, mas não anóminas, sob as nossas percepções. Em Cabo Verde, houve sim um movimento independentista de associação ao Brasil. Era uma parceria estratégica. O ethos foi sufocado, como foi aquele de Angola igualmente de associação ao Brasil. Quem sabe se, ora em tempo de parceria estratégica, não nos afronte a necessidade de complementar o arquipélago ao continente. Incontinente direi que há espaços que almejam o seu norte e há aqueles que precisam do seu sul. Sem desnorte para os nosso interesses nacionais...</span></span></div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-85327848388213356392010-11-20T10:29:00.000-08:002010-11-20T10:30:36.742-08:00Os alquimistas estão chegando<div style="text-align: justify;">Nem tudo o que reluz é ouro. Reluza, em nosso pensamento, o vão das coisas. Reduzam ao nada os exuberantes catedrais. A grande cidade. Pó, simples pó, as torres, os obeliscos e as muralhas. Ó grandes impérios que não passam de hiatos. Esboroando no deserto e no além, as vozes diáfonas dos deuses. Tudo não sendo eufórico, nem luminoso. Tudo não sendo o sentido das coisas. Os alquimistas estão chegando. Vamos à desdita de transmutar os metais menores que ouro. Assumir a degradação dos diamantes. Eles não são eternos. O elixir de uma certa vida. A que se assume alteridade na nossa fragmentação. E das nossas verdades estes ladrilhos que vamos sendo. </div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-81323674718176518322010-11-19T15:26:00.001-08:002010-11-20T08:26:50.619-08:00Exercício de contraste<div style="text-align: justify;">Naturalmente que todos temos as nossas escolhas. Temo-las por razões diversas. Às vezes, por convergências ideológicas, outras vezes por pragmatismo. Isso, sem falar dos interesses, já que a política perspectiva interesses (de grupos e de indivíduos) no espaço e no tempo. Mas quase sempre precisamos de mensagens claras para ajuizar e gizar. Para que nos reflitamos no espelho, é preciso que este não seja embaciado. A face clara das coisas, de que somos ao fim e ao cabo.</div><div style="text-align: justify;"></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Cabo Verde vive um momento pré-eleitoral pautado por uma enorme inflação de mensagens políticas, umas perdendo eficácia comunicativa e outras não ganhando inteligibilidade, aos olhos dos destinatários. Por se tratarem de umas eleições marcadas pela bi-polaridade partidária e pela comparação do perfil de dois partidos em disputa, os discursos para a opinião pública deveriam ser, a nosso ver, mais claros e assertivos, sublinhando contrastivamente não só as suas respectivas características ideológicas, mas, sobretudo, as suas obras enquanto partidos que já governaram o País.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">A par dos partidos, não seria incoerente também o contraste entre os dois líderes. José Maria Neves, actual Primeiro-Ministro, e Carlos Veiga, Primeiro-Ministro nos anos noventa, que tiveram o raro privilégio de servir, aos 41 anos, como chefes de executivo de Cabo Verde, no quadro constitucional da democracia multipartidária e, nesta condição, beneficiar, ambos, de dois mandatos, podendo, nas prerrogativas legais que lhes foi facultado pelo regime, mostrar as suas capacidades de liderança, de patriotismo, de gerir o bem-comum e de gerar prosperidade para o país.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Como sairíamos mais a ganhar, porque mais esclarecidos, se a pré-campanha assumisse um diapasão diferente, numa linha de mensagens (que fosse dos outdoors aos tempos de antena televisivos e radiofónicos, passando pelos discursos nos eventos partidários) com dados, os mais objetivos, respeitantes ao cenário dos resultados ao fim de cada um dos mandatos. Ou seja, os diferentes sectores comparados em 2000, fim dos mandatos de Carlos Veiga, e em 2010, fim dos mandatos de José Maria Neves.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Os tempos são diferentes. Alguém há de querer comparar tempos dispersos e distantes. São razões válidas e aceitáveis. Ninguém detém verdades. Tão pouco detém a Verdade. Ao exercício de contraste...pois, com certeza.</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-29196966972130266152010-11-16T08:37:00.000-08:002010-11-16T08:37:53.736-08:00Poema dos sóis laranjas<div style="text-align: right;"><em>(Pôr do sol é um poema que se evade de quem o pensa)</em></div><br />
Em certas horas, o poema<br />
evade-se de quem o pensa <br />
e percorre-lhe poentes.<br />
<br />
Mau grado por espaços,<br />
vem ele metafórico<br />
(seu fonema)<br />
para os tempos. <br />
<br />
De a palavra ter-se ali, <br />
pela clausura dos versos, <br />
textual, mas incontido recluso, <br />
no só soletrar-se em fuga...<br />
<br />
Dela, mais que à coisa,<br />
o pousar, mesmo calada,<br />
seu vôo inteiro pelo vão<br />
seu tudo ladrilhado<br />
de mim em tanto espelho...<br />
<br />
Dela, que nem ao corpo,<br />
sua sintaxe, tanto que arde<br />
como que parte ou regressa,<br />
ultrapassa o sol de gatear <br />
semântica em gota de água...<br />
<br />
<div style="text-align: right;"><em>(Os poentes, seus cambares...ó cidade)</em></div><br />
Desgovernado, o poema<br />
é mais que procura, alucina<br />
pensá-lo em seu transbordar <br />
e sua loucura ensina<br />
poentes sem ambares azuis,<br />
nem sóis laranjas de certas horas...<br />
<br />
<strong>Filinto Elísio</strong>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-36670285065624027812010-11-14T16:03:00.000-08:002010-11-14T16:03:01.109-08:00Vila Rica de Quartzo<div style="text-align: right;"><em><span style="font-size: xx-small;"> A língua é por essência a ferramenta do encontro </span></em></div><div style="text-align: right;"><span style="font-size: xx-small;">Autor que desconheço</span> </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Nosso quartzo 103</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Como um pêndulo, voltamos sempre à pedra que nos é preciosa. Antes, homenageando Oscar Niemayer. Este ano, a pretexto das letras. Mas, em verdade, porque em finíssima estampa, é uma cidade que a mim descortina o teu sorriso, mesmo quando chove na pedra. O teu sorriso que me encanta. Em alteridade, que os ladrilhos do espelho quebrado de mim permitem. O poeta Guilherme Mansur, diria “vista do quarto/de tanta pedra/quase me quartzo”. No saguão do Hotel Casa Grande, o movimento é grande de partidas e chegadas. Partida do IV Encontro de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa e chegada para o Fórum de Letras de Ouro Preto. E chove. E tu sorris para o quartzo da minha alma... </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Encontros</strong> </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Os encontros de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa tornaram-se o maior e o mais sistemático dos eventos sobre as “africanas”, realizados no Brasil. O I Encontro foi iniciativa da Universidade Federal Fluminense, seguido pelos encontros sediados pela Universidade de São Paulo em 2003 e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 2007. Para além dos professores brasileiros e de toda a lusofonia, os encontros têm sido momentos para a reflexão e para o debate de investigadores, estudantes, escritores e curiosos das letras com a África por pano de fundo. Desse ponto de vista, a Associação Brasileira dos Professores das Literaturas Africanas, com a participação de várias instituições acadêmicas e de várias personalidades universitárias, representa um dos grandes ganhos para o estudo das literaturas africanas, algo que determina um incremento incomensurável para a afirmação e para o intercâmbio entre os países de expressão oficial portuguesas e as “belas letras” que neles se fiam as respectivas culturas.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>IV Encontro</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Este ano o IV Encontro, realizado pela PUC Minas, pela Universidade Federal de Minas Gerais e pela Universidade Federal de Ouro Preto aconteceu na cidade de Ouro Preto, outrora Vila Rica com o seu esplendor de arte e cultura, ora com o estatuto de Patrimônio Mundial da UNESCO. Perspectivar a África a partir de Ouro Preto foi feliz e profícua idéia. Por conseguinte, esse IV Encontro pôs-se a refletir sobre repertórios culturais e literários da África, problematizando-os em seus contextos vários e em suas correlações diversas. Os eixos temáticos – dez ao todo – enfatizavam a pesquisa e o estudo sobre as inúmeras configurações e formatações, sem descurar dos caminhos, da literatura africana. Para além destes, várias mesas com diálogos, uns impertinentes, outros pertinentes, com escritores, professores, estudiosos e outros, não faltando as obras várias de título e de editora, em lançamento e exposição livreira. Uma stravaganza. Um sucesso. Os objetivos, creio, foram alcançados e o projeto dos encontros, dizem os mais entendidos, ficou, não só consagrado, mas qualificado. Exemplo disso: a criação formal da Associação Internacional de Estudos Literários e Culturais Africanos – AFROLIC. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Fórum das Letras</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Igualmente nessa cidade síntese da arte colonial e da marca cultural negra, não apenas pela expressão de tanta história, mas pela exuberância de assaz patrimônio, aconteceu (em articulação ao IV Encontro de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa), o Fórum das Letras de Ouro Preto. O evento, que já se agigantou para ser dos maiores do Brasil, é coordenado pela Universidade Federal de Ouro Preto. Este ano, para homenagear os 300 anos de Vila Rica, o Fórum também teve a África como centralidade. Toda a um manancial de eventos - Programação Principal, Fórum das Letrinhas, Literatura em Cena, Ciclo Bravo! de Jornalismo e Literatura e Via-Sacra Poética, além de exposições e outras manifestações artísticas e folclóricas – com a derivada no continente africano.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Chuva de estrelas</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Embora eu estivesse no Fórum para ver Adélia Prado, João Ubaldo Ribeiro, Ferreira Gullar e Luandino Vieira, fui também apanhado para palestrar no painel sobre “A leitura e a escrita como experiências de alteridade”, realizado no Cine Vila Rica, sob coordenação do Jaime Prado Gouvêa, contista mineiro, editor do Suplemento Literário de Minas Gerais. Nesse nosso painel, também o escritor Flávio Carneiro disse que. “O conto é impregnado de experiência do outro”. Acanhado diante do público, quis eu que a escrita fosse “o meu outro como um poliedro que me impõe a identidade do eu”. E tu, da platéia, sorrias. Por alteridade...</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-32222208812096158742010-11-13T08:38:00.000-08:002010-11-13T08:38:02.335-08:00Ouro Preto<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvJaMb-sHfybJysubOuNRmhIi4Pd6PM1l9sbRSMS0ck7PkA7DHNdOKTjRkmVJA5EGHNPVuFaQIcRPqo-7NjsvCI6T7mfxdK1hc-wiWlBOKIiRWadEgB_TjLescxFlkmDzElUdWksZYv8lA/s1600/Ouro+Preto+2.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="240" px="true" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvJaMb-sHfybJysubOuNRmhIi4Pd6PM1l9sbRSMS0ck7PkA7DHNdOKTjRkmVJA5EGHNPVuFaQIcRPqo-7NjsvCI6T7mfxdK1hc-wiWlBOKIiRWadEgB_TjLescxFlkmDzElUdWksZYv8lA/s320/Ouro+Preto+2.jpg" width="320" /></a></div><div style="text-align: center;"><span style="font-size: xx-small;"><strong>Foto Genivaldo Cordeiro</strong></span></div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-78508240502465518762010-11-10T01:58:00.000-08:002010-11-10T01:58:08.907-08:00Meu paimeu pai foi<br />
ao Rio se tratar de<br />
um câncer (que<br />
o mataria) mas<br />
perdeu os óculos<br />
na viagem<br />
<br />
quando lhe levei<br />
os óculos novos<br />
comprados na Ótica<br />
Fluminense ele<br />
examinou o estojo com<br />
o nome da loja dobrou<br />
a nota de compra guardou-a<br />
no bolso e falou:<br />
quero ver<br />
agora qual é o<br />
sacana que vai dizer<br />
que eu nunca estive<br />
no Rio de Janeiro <br />
<br />
<strong>Ferreira Gullar</strong>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-25099007249527127722010-11-08T04:00:00.000-08:002010-11-08T04:00:04.315-08:00Sakineh Mohammadi Ashtiani<strong>Puro incêndio</strong><br />
<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Incendiário, eu? Creio que não, meu coração. Para mim (e neste momento), o pôr-do-sol é o incêndio já valendo a pena. Os seus tons de amarelo e vermelho; as suas nuances de violeta – tudo a esbater no anil do céu e na turquesa do mar. Faz-se, assim, o construto da minha emoção. E, compondo, em assaz linha, a paisagem (da janela da minha alma, pois claro), acrescentaria um pássaro deslizante a caminho do poente e recitaria (em balbucio mental) o poema “Cinzeiro”, de Jorge Barbosa. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Jantar “chez Nazareth”</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Sentir-se quão frágil a vida. Frágil, contingente e “debole”. Por isso mesmo, bela. Luz afoita em seus apagares. Outros esgares que, podendo, sejam de amores. Noite de vela acesa e leve, crepitando, também frágil, sobre a corola dos falares. Diáfano aroma de cachaça mineira e de um canapé em flores e frutos. E, como também és bela, no que recusas de essencialismo e no que assumes de existencialismo. Sem aparato, apenas de sopro. Sem arquétipo, mas de corpo inteiro. Digo-te ser a curva mil vezes mais certa que a reta. Provam-na a errância, o retorno e o buraco negro. Provam-na a política turva que é também conversa, em ceia de pão, vinho e palavra. Quão frágil (e fugaz incenso de ópio) esta vida. E o bater das horas. Com chuva lá fora...</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Sakineh Mohammadi Ashtiani</strong> </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Uma mulher está em vias de ser apedrejada até à morte no Irão. Chama-se Sakineh Mohammadi Ashtiani. Posso ficar calado, aderir-me aos “animais de capoeira”, como descreve Armênio Vieira sobre os homens inertes? Posso fingir, pobre de mim, desconhecer a barbárie de um Estado Leviatã ou de um Anjo Exterminador que permitem apedrejar uma Mulher até à morte por (leviano talião) da Justiça? Posso, homem de brio humanitário, compactuar em mim com um regime da excrescência, onde o Poder prende, tortura e mata? Posso, para o sono dos justos, aceitar na minha simples fala o fanatismo diabólico de quem se arroga autoridade divina? </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Pedaços Dele</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">A pena da morte, onde quer que seja ou esteja, é o maior atentado à Vida. Aos Direitos Universais. À Humanidade. Ela representa o avanço da barbárie sobre a civilização, merecendo a condenação dos homens e das mulheres de “boa vontade”. Não se trata aqui de condenar o Irão tout court. Trata-se de deplorar e de levantar a voz, por miúda e marginal, contra as execuções dos seres humanos, contra um atentado físico e mental extremo. Contra a dor física de matar e o sofrimento psicológico da morte anunciada. Contra o permitir o diabólico poder aos humanos para serem o Deus da Morte, ao invés de sagrados filhos do Deus Maior. Sem apedrejamento, nem forca. Sem cadeira elétrica, nem injeção letal. Sermos o cataclismo do Bom Deus. Sermos fragmentos e estilhaços. Cacos do seu Cálice em quebra. Pedaços Dele...</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-26519183490341699472010-11-02T05:20:00.000-07:002010-11-02T05:20:49.318-07:00Um santo em mim<strong>Tempo da Cabala</strong> <br />
<div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">O amigo Luís Geraldes, artista plástico português, criado angolano, mas a viver na Austrália, fez-me a pergunta. Era uma inconsequente madrugada no «Galeto», em que eu e o meu editor íamos aos pregos com mostarda e às cervejas bem geladas. E a pergunta era: o que revela o perfeito equilíbrio entre o céu e a terra, a água e o fogo? Talvez quisesse ele que a minha resposta entrasse na Ordem do Templo, mas soltou-me ser a Paz tão-simplesmente, essa coisa que lhe leva o vento de Lisboa e que não pára em tempo da Cabala… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Do eLeitor</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Não o chamaria de eReader, pois não tomo por empréstimo à língua inglesa o que esta flor do lácio também tem. Chamo-o de eLeitor, não eleitor, note-se, que vai às urnas votar, mas aquele que navega e lê os meus textos digitais. Por conseguinte, o meu eLeitor, devidamente identificado (nas antípodas do anónimo, que é apanágio desta parvónia), querendo saber o porquê de textos herméticos, senão mesmo criptográficos. Faço-o entender que estar na eterna idade de ver o luar, acto simples e singelo, nada tem de misterioso. Ver tão-somente para acreditar que a vida vale pelas coisas evidentes. O luar pelo luar, sem outro navegar… </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Cidade novembrina</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Novembrino mês. De ameno tempo. Outrora, novembrino de estio e de fastio. Agora, o cio da terra é das águas. E a leve brisa que bole as árvores da minha cidade? E os acordares, ainda para o sereno, que esta metrópole, a ser, concede? Os cantares de galo numa urbe com Bolsa de Valores! Tens o corpo disforme, ó Praia. Malha mais estranha. A mim entranha tua alma novembrina. Os que te esventram, por estupro e por rapina, não te saberiam no lado de cá. Olho-te do mar aos montes. Lânguida. Sensual. Liiiiiinda. Para o desgosto dos que te desamam. Apesar do lixo e do luxo, dos thugs e dos vips, liiiiiinda. Que ninguém ouse matar a tua silenciosa estética de estares assim no abraço atlântico…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Bashô um santo em mim</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Releio, com calma e vagar, os versos de Maria Helena Sato, de quem sou amigo e admirador. São versos deliciosos. De quem sabe colher o melhor perfume de uma flor de três pétalas: Brasil, Cabo Verde e Japão. Gostei particularmente do livrinho «Bonsais e Haicais», em papel 100% reciclado de embalagens Tetra Pak. Às tantas, Maria Helena escreve:</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><em>Granizo</em></div><div style="text-align: justify;"><em>destruiu meu teto.</em></div><div style="text-align: justify;"><em>O sol me vê </em></div><div style="text-align: justify;"><em>estendida,</em></div><div style="text-align: justify;"><em>quase desistindo</em></div><div style="text-align: justify;"><em>de secar.</em></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Fui assistir à apresentação dos livros de Maria Helena Sato, aqui na Cidade da Praia, e encantou-me esse assumir modernidade poética no imperceptível das coisas. Ricardo Silvestrim, outro poeta bem-aventurado, diria: «Bashô um santo em mim». Total…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;"><strong>Meu Brasil, brasileiro</strong></div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Dou comigo vibrando, de contente, pela vitória de Dilma Roussef nas eleições presidenciais brasileiras. Eia, para Você que se levantou cedíssimo para ir votar, aquele abraço. Em verdade, para mudar o mundo. Estou orgulhoso de Você. E não é que o mundo mudou? O Brasil, que se afirma como quinta maior potência mundial, tem agora uma mulher na Presidência. Antes, já era um ex operário e ex sindicalista. Agora é uma mulher. </div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-5069493641612537364.post-6406570948863302682010-10-23T18:18:00.000-07:002010-10-23T18:18:44.551-07:00Luar<div style="text-align: justify;">Acontece. Sabe tão bem gostar de ver o luar.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Com o olhar de homem mais maduro. Na linha daquela linda morna de Eugénio Tavares, em que o amor se lhe afinava no devagarinho e no tal entardecer da idade. Sem o cavalo largado e a relinchar de tanta juventude. Mas também sem as velas pandas de um veleiro em vento ausente. Apenas sereno, na verdade de chamar o «petit gateau» de bolo de chocolate e na afoiteza de ver a lua a se derramar neste momento a sua condição de astro pela noite.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Eu, por mim, me desculpando pela imodéstia, estou bem no ponto. Nem conto isso de folha em branco. Mais precisamente do monitor em branco. Tenho a pauta cheia e as sugestões são muitas. Uma amiga quis que eu escrevesse sobre a chuva. Outra sugeriu que pusesse no meu texto umas barragens retendo água. E não faltou quem quisesse uma escrita mais consequente, de companheiro das causas e das bandeiras. Mas, repito, estou no ponto de rir de mim. E de tudo…sem maldade nenhuma. </div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Sabe bem o estar assim, reconhecendo, sem drama, mas com calma, estarem estas mal traçadas de hoje meio complicadas. Tendo parco talento (e estro tão-pouco) para outra verve que não esta, escrevo apenas isto que me vai na alma. E faço-o nos meus limites. O nome que encima esta crónica é de uma famosa canção de Gilberto Gil. O mago diria que «a gente precisa ver o luar».</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Quem sou eu? Não me conheço crente, nem descrente. Sou parte do nosso relicário…resguardo-me nestas margens de pessoa comum e me guardo, em metade rio das nossas vidas. Aliás, me vaticinara tudo isto uma baiana Mãe de Santo.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Os pratos que eu gosto? Em termos do comer, me apraz o trivial chicharro grelhado, arroz de feijão e molho escabeche, ou então uma barriga de atum (também na grelha), batatas cozidas e com azeitonas grandes. Obviamente, salada de alface, pepino e tomate, regada com azeite extra-virgem e o vinagre balsâmico. Pão, de todo o tipo. Um luminoso ovo estrelado, de vez em quando. Tudo disposto em prato grande, com aqueles desenhos de Miró. E, em termos do beber, chá gelado ou vinho tinto (para o fresco e sem frescuras).</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Os poemas que leio? Gosto de tudo, desde aqueles versos de Neruda aos versos nas camisetas da Feirinha, passando pelo teu silenciar que me invade na paz de Alberto Caeiro. Imagine, fosse eu aqui listar os poemas que gosto e leio! Prefiro falar sobre as praias desertas ou as montanhas intermináveis. O homem banal tem cada uma!</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Qualquer dia, saio a campear por aí, que o céu é grande e o mundo é largo. E a glória, diga-se por vezes o seu viés, é poder campeá-los. Entrementes, ter coisas e causas pelos caminhos, sobreviver aos vendavais e à calmaria, regressar a uma espécie de começo mesmo que nada nítido ao espelho. Qualquer dia, sou de viagem. Filosoficamente, já sou vadiagem…</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Poderei nesta idade, de homem a caminho dos cinquenta, abrir-me ao jogo do destino? Fazer o quê se me alumia no coração a chama de uma estranha paixão? Estou idílico, leviano ou apenas sendo eu nesta eterna idade? Em verdade, nem sei. Nem interessa sabê-lo. Mas sabe tão bem gostar de ver o luar.</div><div style="text-align: justify;"><br />
</div><div style="text-align: justify;">Bem, vou dormir o sono dos justos.</div>Filinto Elisiohttp://www.blogger.com/profile/13716688029032067302noreply@blogger.com