sexta-feira, dezembro 11, 2009

Silentes




A Peste


Folheio o livro de Camus. E a peste sitia a cidade de Oram. As personagens saem do livro e entram na vida real. Invadem a cidade da Praia. Mas o foco vai para milhares de soldados que embarcam para o Afeganistão. Diz-se que são mais de trinta mil. Uma loucura! Os deuses devem estar loucos. Os homens estão chalados pela certa. Sujeitos ao nexo do poder e do dinheiro. De um lado e do outro, ninguém acredita em Deus, senão no tráfico. Uns do oriente para o ocidente; outros do ocidente para o oriente. Longitudinal loucura. Os helicópteros começam a sobrevoar montanhas. Ao som dos Pink Floyd. Another brick in the wall. Folheio o livro de Camus, na cidade da Praia…



Delírios & girassóis

O homem atravessa a cidade e pára sob um grande pórtico. É o Arco de Triunfo, em Paris. Começa a mirar as avenidas em feixe, o frenesim da Praça das Estrelas. Sente-se, de repente, a perder os sentidos. Aquilo parece o centro nevrálgico do mundo. Mas não o é. Se tanto é apenas a cidade na sua trepidação do rush-hour. Impele-se para o metro. Cambaleante. Pela escada rolante. De repente, o branco. O blackout e, depois, o grande branco. Não está cego. Está sem memória. Amnésia total. Faz o caminho de volta, perscrutando pela névoa dos olhos a saída do metro. O grande pórtico com a bandeira gigante no tecto. Parece-lhe a morte. A grande lógica. O nexo todo. O resto, agora sabe-se, é a aleatoriedade da vida. Não interessa…


Tinta-da-china

Está ofegante. Terá visto o diabo em pessoa? Ou apenas um coqueiro que não dá só cocos? Recito: os frutos do coqueiro não são só cocos. Tento acalmá-lo. E chove de mau jeito. Primeiro, porque Novembro não se supõe em águas. E, segundo, porque o aguaceiro borra a maquilhagem das damas. As faces borradas de base, batom e rímel. O suplício das aguarelas desse jardim. Impressionismo. De lírios, jasmins e girassóis. Ao espelho, olha-se para o macho cabeludo. Fosse ele mandarim. O arroz à cantonesa é um poema. O triunfo dos patos. A iguaria no centro do prato, ladeado de talheres. Candeeiros com dragões e mil ideogramas. Soja é molho que lembra a tinta-da-china…


Das torres

Façam-se as mesuras ao falo. Continências a seu peso e medida. Esse é o contador de fábulas, comenta uma vidente. Das noites que não foram mil e uma. Pão e vinho. A cear onde as conspirações se fazem. Ide, depois, contaminar o mundo. Pão de trança. E Chateau-neuf du Pape, o tinto. Um alentejano maduro já era de bom tamanho. E à fala? Um novo mundo é possível, dirá um manifestante, antes de se incendiar no meio da Time Square. Agora, está-se em Nova Iorque. Caem as torres. Vai-se a uma grande matança em Manhattan. O 11 de Setembro? É pá, não comeces. Está-se mesmo a ver Salvador Allende a morrer e La Moneda a cair. Antes de ser Ben Laden, o fatídico já era de Pinochet. Mas, dizia-se, as mesuras…