Valha-me este dia
Não escreverei aqui do odiar as coisas mais deploráveis, como fosse eu, pobre mortal e pecador, o justiceiro deste dia que, apesar de aziago, tem em segredo do existir, os seus cantares. Nem porei, inscrito em crónica, o aviltar aos céus e catedrais, tão pouco o farei aos infernos, posto ser cá dentro a Caverna de Platão que se interioza e que me aterroriza mesmo quando se faz luz depois desta treva. Fico em paz e no meu canto, exilado na montanha, em zen e por nirvana, temente dos mistérios e atinente às buscas. Fico, andarilho monge e arqueiro manso, em querer saber do Graal, em querer saber do nada que, vez por outra, me ilumina…
Tempo, tempo, tempo, tempo…
Meus ilustres amigos, podeis querer recordar o passado, exercício necessário e mais do que saudável, tanto que Freud o explica bem. Mas regressar ao tempo ido, para além de quase impossível, se nos configura absurdo. As coisas passam. Passam-se até. E as sintaxes, as morfologias, as semânticas e as essências, bem como as ciências, vão sendo outras. Longe vai o tempo em que as coisas da metrópole se espraiavam pequenas e mediocres por esta terra, então província. Em verdade, mercê do vigente ordenamento (ou reordenamento em querendo vossas senhorias), já não há a antiga metrópole, nem a então província. Há mais de trinta e cinco anos que não as há. E este não haver foi o facto mais relevante (e, por consequência, mais sublime) de todo o processo histórico cabo-verdiano! Foi preciso, primeiro, a libertação (soberania) para, depois, conqusitarmos a liberdade (democracia)…
Travo ao subtexto
Revejo a prosa em perspectiva. Hoje, deu-me de vasculhar as gavetas, os cadernos, os moleskines, os arquivos electrónicos, os jornais, as revistas, os livros. Deu-me de ir ao baú das coisas feitas ao longo do tempo. Fazer o balanço geral. Os contos, as crónicas, as notas, as caudalosas fráguas de um romance em rampa. Tudo se sujeita a retoque, acerto e concerto. Nenhuma obra literária se esgota em seu próprio retrato. Para lá do formato, aparato e conteúdo. Fica-lhe premente e o inerente no dito e seu não dito. Fica-lhe o travo do subtexto. A escrita de ninguém se sublima em definitiva feição e muito menos em perfeição. Nem mesmo a de Eugénio Tavares ou de António Aurélio Gonçalves que, em podar a flor do lácio, dentre todos nestas ilhas, foram os mais delicados. Nem mesmo a tais mestres…