domingo, novembro 14, 2010

Vila Rica de Quartzo

     A língua é por essência a ferramenta do encontro
Autor que desconheço

Nosso quartzo 103

Como um pêndulo, voltamos sempre à pedra que nos é preciosa. Antes, homenageando Oscar Niemayer. Este ano, a pretexto das letras. Mas, em verdade, porque em finíssima estampa, é uma cidade que a mim descortina o teu sorriso, mesmo quando chove na pedra. O teu sorriso que me encanta. Em alteridade, que os ladrilhos do espelho quebrado de mim permitem. O poeta Guilherme Mansur, diria “vista do quarto/de tanta pedra/quase me quartzo”. No saguão do Hotel Casa Grande, o movimento é grande de partidas e chegadas. Partida do IV Encontro de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa e chegada para o Fórum de Letras de Ouro Preto. E chove. E tu sorris para o quartzo da minha alma...

Encontros

Os encontros de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa tornaram-se o maior e o mais sistemático dos eventos sobre as “africanas”, realizados no Brasil. O I Encontro foi iniciativa da Universidade Federal Fluminense, seguido pelos encontros sediados pela Universidade de São Paulo em 2003 e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 2007. Para além dos professores brasileiros e de toda a lusofonia, os encontros têm sido momentos para a reflexão e para o debate de investigadores, estudantes, escritores e curiosos das letras com a África por pano de fundo. Desse ponto de vista, a Associação Brasileira dos Professores das Literaturas Africanas, com a participação de várias instituições acadêmicas e de várias personalidades universitárias, representa um dos grandes ganhos para o estudo das literaturas africanas, algo que determina um incremento incomensurável para a afirmação e para o intercâmbio entre os países de expressão oficial portuguesas e as “belas letras” que neles se fiam as respectivas culturas.

IV Encontro

Este ano o IV Encontro, realizado pela PUC Minas, pela Universidade Federal de Minas Gerais e pela Universidade Federal de Ouro Preto aconteceu na cidade de Ouro Preto, outrora Vila Rica com o seu esplendor de arte e cultura, ora com o estatuto de Patrimônio Mundial da UNESCO. Perspectivar a África a partir de Ouro Preto foi feliz e profícua idéia. Por conseguinte, esse IV Encontro pôs-se a refletir sobre repertórios culturais e literários da África, problematizando-os em seus contextos vários e em suas correlações diversas. Os eixos temáticos – dez ao todo – enfatizavam a pesquisa e o estudo sobre as inúmeras configurações e formatações, sem descurar dos caminhos, da literatura africana. Para além destes, várias mesas com diálogos, uns impertinentes, outros pertinentes, com escritores, professores, estudiosos e outros, não faltando as obras várias de título e de editora, em lançamento e exposição livreira. Uma stravaganza. Um sucesso. Os objetivos, creio, foram alcançados e o projeto dos encontros, dizem os mais entendidos, ficou, não só consagrado, mas qualificado. Exemplo disso: a criação formal da Associação Internacional de Estudos Literários e Culturais Africanos – AFROLIC.

Fórum das Letras

Igualmente nessa cidade síntese da arte colonial e da marca cultural negra, não apenas pela expressão de tanta história, mas pela exuberância de assaz patrimônio, aconteceu (em articulação ao IV Encontro de Professores de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa), o Fórum das Letras de Ouro Preto. O evento, que já se agigantou para ser dos maiores do Brasil, é coordenado pela Universidade Federal de Ouro Preto. Este ano, para homenagear os 300 anos de Vila Rica, o Fórum também teve a África como centralidade. Toda a um manancial de eventos - Programação Principal, Fórum das Letrinhas, Literatura em Cena, Ciclo Bravo! de Jornalismo e Literatura e Via-Sacra Poética, além de exposições e outras manifestações artísticas e folclóricas – com a derivada no continente africano.

Chuva de estrelas

Embora eu estivesse no Fórum para ver Adélia Prado, João Ubaldo Ribeiro, Ferreira Gullar e Luandino Vieira, fui também apanhado para palestrar no painel sobre “A leitura e a escrita como experiências de alteridade”, realizado no Cine Vila Rica, sob coordenação do Jaime Prado Gouvêa, contista mineiro, editor do Suplemento Literário de Minas Gerais. Nesse nosso painel, também o escritor Flávio Carneiro disse que. “O conto é impregnado de experiência do outro”. Acanhado diante do público, quis eu que a escrita fosse “o meu outro como um poliedro que me impõe a identidade do eu”. E tu, da platéia, sorrias. Por alteridade...